O movimento sindical brasileiro, apesar de ter promovido poucas greves e mobilizações, pode ser considerado vitorioso no primeiro Governo Lula, tendo como parâmetro o Governo FHC, especialmente pelos resultados favoráveis nos marcos econômicos, regulatórios e políticos. No segundo mandato, entretanto, o resultado poderá ser desastroso, sob todos os aspectos, se for mantido o padrão de comportamento do primeiro.
Econômica e financeiramente, a despeito da continuidade da política econômica, houve aumento real do salário mínimo, reestruturação remuneratória de servidores públicos, aumento de postos de trabalho, inclusive com carteira assinada, ganho real nas negociações coletivas, correção na tabela do imposto de renda, crédito consignado e microcrédito com juros baixos, entre outros benefícios, como a correção dos benefícios previdenciários acima da inflação.
Politicamente, a retirada do Congresso de projeto de flexibilização da CLT, a nomeação de ministros do Trabalho oriundos do movimento sindical, a participação dos trabalhadores no Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social e no Fórum Nacional do Trabalho, ainda que o Presidente tenha prestigiado mais as centrais sindicais, e o fato de o Governo ter atribuído ao movimento sindical os ganhos econômicos assegurados por força da conjuntura favorável, especialmente no plano internacional, podem ser considerados vitórias.
A correlação de forças no interior do movimento sindical, apesar da ausência de grandes mobilizações, se mantém razoavelmente equilibrada. Houve o surgimento, pela esquerda, do Conlutas, e pelo centro, da Nova Central Sindical de Trabalhadores, que contribuíram para oxigenar o movimento sindical. Apesar disto, foi mantida a hegemonia política da CUT e da Força Sindical. A CUT, que pagou um preço elevado por erros do Governo, especialmente na reforma da previdência, cresceu menos que a Força Sindical, que praticamente dobrou seu número de filiados.
No quesito regulatório e/ou de legislação, diante da ameaça de retrocessos, o balanço foi positivo. O presidente da República, com exceção da reforma da previdência do servidor e da mudança nos direitos trabalhistas de empregados das pequenas e microempresas, se comportou de acordo com o pensamento majoritário do movimento sindical: a) retirou do Congresso projeto que flexibilizava a CLT; b) não fez a reforma trabalhista; c) propôs, mas não teve condições de aprovar a reforma sindical; e d) encaminhou, ainda em 2003, o pedido de retirada do projeto de terceirização e prestação de serviços, mas até o final do primeiro mandato o presidente da Câmara não havia submetido a matéria ao plenário da Casa.
Sem mobilização, dificilmente o movimento sindical manterá este mesmo padrão de ganhos no segundo mandato do presidente Lula. A tendência, portanto, será de menos “cooperação” e mais mobilização do movimento sindical brasileiro, tanto pelas disputas internas quanto pela necessidade do contraponto às forças conservadoras que farão parte da coalizão de apoio ao Governo.
Apesar de o presidente, em sua campanha de reeleição, ter afastado a idéia de reforma trabalhista e previdenciária, a pressão das forças de mercado no sentido de sua inclusão na pauta de reformas será muito forte. Se não houver o contraponto do movimento sindical, o Governo poderá ser forçado a incluir essas duas matérias na pauta. A primeira como exigência do setor empresarial para apoiar a reforma sindical e a segunda em razão das alegações de supostos déficits em decorrência do aumento real ao salário mínimo, com impacto nas contas da previdência.
A flexibilização de aspectos da legislação trabalhista havida na Lei Geral das Pequenas e Microempresas, aquelas com faturamento até R$ 2,4 milhões, e a absurda emenda do Senado ao projeto de lei da Super Receita, dão a exata dimensão do que poderá ocorrer em matéria trabalhista, caso não haja uma reação adequada do movimento sindical. A emenda ao Projeto de Lei nº 6.272/2005, da Super Receita, de autoria do Senador Ney Suassuna (PMDB/PB), além de tratar de matéria alheia ao tema do projeto, impede os Auditores do Trabalho de fiscalizar o vínculo empregatício e autuar empresas que contratam prestadores de serviços. A emenda será votada separadamente dos demais aspectos do projeto, que já estão aprovados pelas duas Casas do Congresso, e precisa ser rejeitada ou, se aprovada, ser vetada pelo presidente da República, sob pena de retrocesso nas relações de trabalho.
Os desafios do movimento sindical no segundo mandato do presidente Lula, pelas razões expostas, certamente forçarão relações com o Governo em novas bases, com mais pressão e mobilização, até por uma questão de sobrevivência política. Veremos.
Fonte: Diap (Antônio Augusto de Queiroz, jornalista, analista político e Diretor de Documentação do Diap)