Um estudo da delegacia paulista do Sindicato Nacional dos Auditores-Fiscais da Receita Federal (Unafisco-SP) sobre o gastos do governo com a dívida pública entre 2000 e 2005, divulgado seis dias antes da eleição, despertou grande interesse da imprensa. O documento “Execução Orçamentária no Brasil – de FHC a Lula” dizia que o país gastou R$ 1,2 trilhão, entre juros e amortizações, mais da metade de toda riqueza que a economia deverá produzir este ano. E, mesmo assim, a dívida ainda supera R$ 1 trilhão.
No dia seguinte à divulgação, a direção nacional do Sindicato mandou para veículos de imprensa uma nota oficial em que salientava que o estudo era de inteira responsabilidade da delegacia paulista. Na última sexta-feira (27), foi possível entender a preocupação.
O Unafisco elaborou outro documento, que classifica de “conclusivo”, em que apresenta números diferentes e, sem mencionar direta ou nominalmente a delegacia paulista, aponta erros e funciona como uma espécie de desmentido do estudo anterior.
Pelo trabalho “Arrecadação tributária e os gastos com serviços da dívida”, a amortização e o pagamento de juros somaram R$ 745 bilhões de 2000 a 2005, um terço a menos do que a conta feita pelos fiscais paulistas. E um valor menor do que o tamanho atual da dívida.
“O problema da dívida existe, mas as diferenças metodológicas comprometem a compreensão da sua dimensão”, diz o presidente interino do Unafisco, Roberto Piscitelli, ao justificar o estudo. Além disso, segundo ele, o Sindicato também quer preservar sua credibilidade. “Temos que ter muito cuidado com as análises, porque queremos ser interlocutores da mídia, do governo e de outras entidades.”
Metodologias diferentes
A diferença de números entre os dois estudos pode ser explicada por dois erros que a delegacia paulista teria cometido, segundo o Unafisco Nacional. O primeiro foi misturar carga tributária e pagamentos da dívida feitos não só com impostos, mas também com operações de rolagem da dívida. O outro erro foi não selecionar adequadamente as informações do orçamento que serviram de base às análises e conclusões.
O governo administra a dívida (juros e amortizações) com recursos obtidos via cobrança de impostos e empréstimos do “mercado”. Ou então apenas rolando a dívida. O dinheiro de impostos usado na gestão da dívida é conhecido como “superávit primário”. De 2000 a 2005, totalizou R$ 383 bilhões. Já os empréstimos do “mercado” atingiram R$ 362 bilhões. Somando-se ambos, tem-se R$ 745 bilhões.
Para chegar a R$ 1,2 trilhão, a delegacia paulista dos fiscais da Receita incluiu, segundo o Unafisco, operações de rolagem que constituem quase um orçamento à parte. No orçamento tradicional, o governo custeia suas despesas – juros da dívida, investimentos, folha de pessoal, programas sociais – com impostos. No outro, só entra dinheiro emprestado pelo “mercado”, que serve apenas para rolar a dívida pública.
Para se ter uma idéia destes dois orçamentos: a proposta de orçamento 2007 enviada pelo governo ao Congresso soma R$ 1,5 trilhão. Deste total, R$ 655 bilhões são de rolagem de dívida e R$ 70 bilhões de pagamento de juros com empréstimos do “mercado”. O gasto com juros e amortizações via recursos tributários custará cerca de R$ 90 bilhões.
Segundo o Unafisco Nacional, estabelecer a diferença entre pagamento da dívida com impostos, com empréstimos do “mercado” e via rolagem é essencial, pois o estudo da delegacia paulista trabalhou em cima da idéia da quantidade de tributos cobrados da população é direcionada para a dívida.
Feita essa diferença, o Sindicato diz que, em 2005, o pagamento da dívida (juros e amortizações) consumiram 17% das receitas tributárias. A delegacia paulista havia dito que mais de 40% do orçamento vai para a dívida.
Em relação ao outro erro (seleção de informações), o Unafisco diz que a delegacia paulista deveria ter desmembrado uma rubrica chamada de “encargos especiais”, base das análises e conclusões do estudo. A rubrica englobaria não só gasto com juros, mas também algumas despesas com Previdência e Assistência Social, indenizações e até apoio a deficientes físicos. Esta definição da rubrica consta de um manual da Secretaria de Orçamento Federal, principal repartição do ministério do Planejamento para temas como despesas públicas.
Fonte: Agência Carta Maior