Somente com uma justiça mais voltada aos interesses coletivos e não aos interesses privados e do capital poderemos almejar, de fato, a construção de uma grande democracia. Para que isso seja possível é preciso quebrar paradigmas, por meios de reformas da legislação, revisão dos modelos de ensino jurídico, aperfeiçoamento das relações de trabalho, entre outras medidas.
A verdade é que vivemos a massificação do legalismo e a visão formal da lei pretere àqueles que o direito deveria proteger. Quase sempre os hipossuficientes são massacrados por decisões judiciais que privilegiam o interesse econômico em detrimento à uma visão mais social que acreditamos ser fundamental na forja de uma sociedade mais igualitária, fraterna e, acima de tudo, justa.
O recente caso do Pinheirinho, cuja invasão foi sustentada por uma decisão judicial, expôs as vísceras da visão oligárquica que campeia o Poder Judiciário. Uma ideia de “ordem”, que rememora, de maneira nada oportuna, o modelo de segurança nacional de nosso regime de exceção, onde, na verdade, possibilitou uma grave violação aos direitos humanos em favor do interesse privado e da especulação imobiliária.
Os trabalhadores da Justiça, aí compreendendo o Poder Judiciário e o Ministério Público, têm um papel a cumprir nesse debate e, ao longo dos 20 anos de história da Fenajufe, consolidaram lastro para isso.
A Fenajufe debateu, de forma vanguardista, a necessidade de um controle externo do Poder Judiciário e, nesse sentido, o surgimento tanto do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e como do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) foram muito bem-vindos. Ocorre que esses Conselhos estão longe daquilo que julgamos ser o ideal, pois sua composição ainda sustenta uma concepção elitista, conservadora e corporativista. Não têm uma real participação da sociedade em sua composição como sempre defendemos e de forma alguma cumpre com o papel amplo de ser um controle realmente externo, democrático e social do Judiciário e MPU.
O senso de justiça não é privativo de magistrados, membros do MP ou de advogados e, sim, perfaz um conceito que deveria, de forma ampla, abranger outros segmentos de nossa sociedade. Quando defendemos o controle externo nossa concepção em nada tem a ver com a visão que os editoriais dos grandes veículos de comunicação nos atribuem. Muito pelo contrário, defendemos a liberdade e pluralidade e nem de longe compactuamos com uma visão que queira tutelar o Poder Judiciário, que, sob o argumento da celeridade, retira a autonomia do juiz de primeira instância e sufoca o dinamismo que é próprio do direito. Também não concordamos com a busca por uma centralização do poder dos atuais conselhos, que tomam decisões ferindo e atacando a autonomia dos tribunais.
Embora o trabalho dos Conselhos Nacionais mereça ressalvas, não podemos deixar de julgar acertada a apuração, por parte do CNJ, de movimentações financeiras exorbitantes por parte de alguns magistrados e servidores. A defesa assumida por entidades de classe dos magistrados não pode partir do pressuposto que existam castas de iluminados que não mereçam investigação, sob a premissa que não há corrupção ou de honestidade absoluta na totalidade do Poder Judiciário. Muito antes, pelo contrário, essas entidades deveriam assumir e apoiar a iniciativa do CNJ e defenestrar aqueles que maculam sua classe.
Vale destacar, portanto, que a Fenajufe e os seus sindicatos de base, em vários momentos de sua trajetória, defenderam que todas as denúncias de corrupção, casos de má utilização de verbas, nepotismos e desvios fossem apurados, até que se chegasse a uma resposta concreta sobre as acusações. Em alguns casos, tal atuação fez com que servidores e dirigentes sindicais fossem perseguidos, sem que estes, no entanto, perdessem a convicção sobre a necessidade de levar a público e de ter apurados todos os problemas detectados em órgãos do Judiciário.
Assim, em que pesem as limitações do CNJ e as críticas a muitas posições adotadas pelo STF, a decisão na semana passada dos ministros da Suprema Corte acerca do poder de investigação do CNJ foi extremamente acertada e coloca luz num Pod
er que sempre foi obscurecido pela pompa e pelo excesso de formalismo. Situação que aos longos de muitos anos intimidou os humildes a procurar seus direitos. A decisão contraria a lógica corporativista que durante décadas foi praxe no Poder Judiciário e poderá inaugurar um novo momento na consolidação de um conceito de justiça mais amplo, fluido e democrático. Embora saibamos que só isso não basta, é um bom começo.
Fenajufe
Federação Nacional dos Trabalhadores do Judiciário Federal e do MPU