A resolução do Conselho Nacional de Justiça de combate ao nepotismo em todo país está batendo de frente com o Judiciário de alguns estados. Uma avalanche de ações de parentes de juízes e desembargadores tentando defender suas sinecuras desabou nos tribunais de justiça de pelo menos seis estados brasileiros.
Em Minas Gerais, por exemplo, 68 servidores não concursados e parentes de juízes primeira instância e do Tribunal de Justiça do estado já foram beneficiados por liminares para se manterem em seus cargos. A informação é da Ordem dos Advogados do Brasil.
A lista de servidores beneficiados em Minas, segundo a OAB, inclui mulheres, filhos, filhas, sobrinhos e sobrinhas, que terão o emprego garantido até o julgamento do mérito das seis ações, impetradas nas 6ª e 7ª Varas da Fazenda Estadual. O TJ mineiro não informa o número de servidores que foram contratados sem concurso público e também não confirma o número de beneficiados pelas liminares. O TJ afirma que não comentará sobre as liminares até decisão definitiva.
O Ministério Público e a Advocacia-Geral do estado devem contestar as decisões. O MP mineiro estuda instaurar ações de improbidade administrativa, colocando em suspeição o próprio tribunal, já que a maioria dos desembargadores mantém parentes contratados sem concurso em todas as instâncias e podem estar sendo omissos em relação à Resolução 7 do CNJ.
No Rio de Janeiro, desembargadores do Tribunal de Justiça do estado impetraram Mandados de Segurança contra o presidente do órgão, Sérgio Cavalieri, para garantir que os parentes não sejam demitidos. De acordo com o último levantamento divulgado na imprensa, dos 155 desembargadores do órgão, 44 haviam ajuizado ações desse tipo. Desses, 38 conseguiram liminares contra a demissão. Alguns desembargadores e seus parentes entraram em conjunto com as ações. A alegação é a de que é preciso preservar direitos, que podem ser violados com as exonerações.
Em Mato Grosso do Sul, de 14 a 16 servidores do Tribunal de Justiça do estado estão amparados por liminar contra a Resolução que veda o nepotismo. Mesmo assim, o presidente da Corte, desembargador Claudionor Miguel Duarte, espera exonerá-los até o dia 14 de fevereiro, em cumprimento à determinação do CNJ. Para o desembargador, se esses servidores quiserem permanecer nos cargos, terão de ingressar com novo pedido de liminar.
O presidente nacional da Ordem dos Advogados do Brasil, Roberto Busato, condenou as diversas liminares que vêm sendo concedidas por desembargadores de Tribunais de Justiça brasileiros em favor de parentes de magistrados e de procuradores que praticam o nepotismo. “É lamentável a atitude desses magistrados, que deveriam ser os primeiros a apoiar a medida adotada por esses Conselhos a fim acabar com essa prática nefasta que é o nepotismo”, afirmou Busato. Ele espera que os tribunais superiores derrubem a enxurrada de liminares.
Corte na carne
A Resolução anti-nepotismo do CNJ é de 18 de outubro de 2005. Por meio dela, o Conselho encarregado do controle externo do Judiciário veda a nomeação e manutenção de parentes de juízes e desembargadores até o terceiro grau em cargos de comissão e chefia. A resolução proíbe, também, a contratação pelos tribunais de empresas terceirizadas que possuam em seus quadros parentes de juízes.
O CNJ deu prazo até 14 de fevereiro para que os servidores que tenham relação familiar com juízes, desembargadores e ministros dos tribunais superiores sejam exonerados. Ficam livres da demissão os parentes que foram admitidos mediante concurso público ou por meio de processo de seleção devidamente regulamentado. O CNMP editou resolução semelhante à do CNJ em setembro de 2005, determinando a exoneração de parentes de procuradores e promotores nos estados.
Tramitam no Supremo Tribunal Federal sete ações contra a Resolução 7 do CNJ. São duas Ações Diretas de Inconstitucionalidade — uma de autoria da Assembléia Legislativa do Mato Grosso e a outra da Associação Nacional dos Magistrados Estaduais — e cinco Mandatos de Segurança movidos por parentes de juízes.
Também tramita uma Ação Declaratória de Constitucionalidade para garantir a legalidade da decisão editada pelo CNJ. Esta última foi movida pela Associação dos Magistrados Brasileiros e visa fazer valer a Resolução, pondo fim a interpretações contrárias à medida. Caso seja declarada sua constitucionalidade, todos os Mandados de Segurança impetrados nos estados perderão a validade e serão suspensas as ações que contestam a legalidade da resolução.
Nas ações, a maioria dos servidores parentes de juízes e de procuradores do MP alega que os atos administrativos baixados pelo CNJ e CNMP são inconstitucionais por não lhes caber legislar sobre tal matéria. Os funcionários da Justiça defendem sua permanência nos cargos com base na Lei Estadual 13.145/97, que admite a contratação de até dois parentes por membros do Poder Judiciário.
Contra a Resolução
O Tribunal de Justiça do Espírito Santo julgou Mandado de Segurança impetrado por um grupo de 22 servidores, todos cônjuges e parentes de 1º, 2º e 3º graus de procuradores e promotores do estado. O pedido era contra a exoneração determinada em resolução do CNMP. O relator da ação, desembargador Sérgio Bizotto, negou o pedido feito pelos 15 servidores e manteve a exoneração. No entanto, atendeu à solicitação feita pelos demais sete funcionários, que estão impedidos de serem demitidos até que ocorra o julgamento do mérito da ação.
A decisão do desembargador abrangeu quatro servidores que têm parentesco em terceiro grau com representantes do MP do estado. O desembargador tomou como base para a concessão das liminares, a Constituição do Espírito Santo, que proíbe a contratação de parentes em cargos de comissão até o 2º grau.
Em Goiás, 20 funcionários do Tribunal de Justiça do Estado que têm algum grau de parentesco com juízes e desembargadores, entraram com ação na Justiça para garantir a permanência nos cargos. Outros 35 devem protocolar ação semelhante. Na ação cautelar, mulheres, filhos, irmãos, sobrinhos, tios, genros e cunhados dos juízes requerem a concessão de liminar que suspenda os efeitos do Decreto 1.356/2005. Baixado pelo presidente do TJ de Goiás, desembargador Jamil Pereira de Macedo, o decreto tem o objetivo de conhecer os servidores que serão atingidos pela resolução do CNJ e terão de ser demitidos até 14 de fevereiro.
Servidores do estado do Maranhão não tiveram tanta sorte. O Supremo Tribunal Federal negou Mandado de Segurança impetrado por quatro servidores do Tribunal Regional do Trabalho do estado, que tentaram se livrar da exoneração. O pedido foi apreciado pela ministra Ellen Gracie. Uma das autoras da ação, esposa de um dos juízes do TRT, alegou que já ocupava cargo de confiança quando se casou.
Fonte: Revista Consultor Jurídico