O governo federal dá mais um passo no sentido de ampliar e estender a todos os setores da administração pública a terceirização, apontado por sindicatos, pesquisadores e juristas como uma forma de contratação que precariza as relações de trabalho. O Diário Oficial da União publicou o Decreto nº 9.507/2018, que dispõe sobre a contratação de empresas terceiras para execução indireta de “serviços da administração pública federal direta, autárquica e fundacional e das empresas públicas e das sociedades de economia mista controladas pela União”.
O decreto saiu a três meses do fim de um dos mais impopulares governos da história do país. O presidente Michel Temer (MDB) o publicou menos de um mês após o Supremo Tribunal Federal julgar legal a terceirização de todas as áreas de uma empresa. Demonstra, ainda, a evidente intenção do governo de aplicar nos serviços públicos a Lei nº 13.429/2017. Aprovada no ano passado, essa lei permite a terceirização em todas as etapas de produção no trabalho e é alvo de uma campanha nacional por sua revogação. “Embora texto semelhante ao objeto do regulamento já contasse no Decreto 200/67, o atual estabelece algumas diretrizes mais objetivas à possibilidade daquilo que chama de execução indireta dos serviços. Na prática, isso significa a terceirização dos serviços, possíveis, de acordo com o texto, desde a administração direta até empresas públicas, passando por autarquias e fundações”, observa o advogado César Lignelli, do Departamento Jurídico do Sintrajud.
A medida foi recebida com duras críticas por dirigentes sindicais de diversas áreas, mesmo daquelas que, ao menos explicitamente, não são atingidas diretamente pelo decreto, caso dos auditores fiscais do trabalho. “Para quem não acreditava que a terceirização irrestrita alcançaria o serviço público de forma avassaladora, a edição do Decreto nº 9.507/2018 jogou por terra todas as dúvidas que pudessem pairar sobre o tema”, disse, em artigo publicado no site da entidade, o presidente do sindicato do setor (Sinait), Carlos Silva. “Resguardando apenas algumas áreas, o decreto permite a contratação de serviços terceirizados em praticamente todos os setores e órgãos”, constata o auditor do trabalho.
Embora a intenção pareça evidente, não consta no decreto nenhum item que diga que a terceirização da atividade-fim das administrações públicas está liberada para todas as áreas. Há ressalvas, mesmo que passíveis de serem removidas, na avaliação do advogado sindical. “O inciso IV do artigo 3º prevê outra exceção para estabelecer que os serviços que sejam inerentes às categorias funcionais abrangidas por plano de cargos de órgão ou entidade não podem ser objeto de execução indireta. Isso pode significar que se um órgão tem seu corpo funcional regido por uma lei que prevê cargos, salários e atribuições correlatas não pode passar tais ‘tarefas’ a um serviço terceirizado”, explica César Lignelli.
O registro dessa impossibilidade no decreto, analisa o advogado, deve-se provavelmente a restrições legais e mesmo constitucionais, além de súmula do Tribunal de Contas da União contrária à contratação de terceiros para realizar funções atribuídas a servidor concursado no plano de cargos e carreiras. “Mas pelo próprio inciso, há duas possibilidades de terceirização, mesmo com a vigência de Plano de Cargos: permissão legal e cargo extinto”, disse.
Proibições na Administração federal
Segundo o artigo 3º do decreto, não serão objeto de execução indireta na Administração Pública federal direta, indireta, autárquica e fundacional os seguintes serviços:
– que envolvam tomada de decisão ou posicionamento nas áreas de planejamento, coordenação, supervisão e controle;
– considerados estratégicos pelo órgão (proteção de controle de processos e de conhecimentos e tecnologias);
– relacionados a poder de polícia, de regulação, de outorga de serviços públicos e aplicação de sanções;
– inerentes às categorias funcionais abrangidas pelo plano de cargos do órgão ou entidade (a não ser que haja disposição legal em contrário ou se tratar de cargo em extinção).
Isto é, não será possível a contratação de serviços para o desempenho de funções atribuídas por lei às diversas carreiras federais.
Fica proibida a terceirização de cargos de chefia, que envolvam conhecimento estratégico (tecnologia militar, por exemplo) ou atividades que envolvam fiscalização ou regulação, como auditoria fiscal ou do trabalho, ou na área de segurança pública.
Fonte: Sintrajud e DIAP com edição do Sintrajusc