No sábado (09/11), aconteceu em Brasília o Seminário Nacional da Fenajufe sobre Carreira. A mesa de abertura foi composta pelos coordenadores gerais da Federação, Adilson Rodrigues, Mara Weber e Ramiro López. O encontro discutiu modelo de Estado e o papel do servidor público, diretrizes para construção de carreira e o resgate da discussão acumulada pela categoria.
A primeira mesa de debates, conduzida pelos coordenadores da Fenajufe, Roberto Ponciano e Saulo Arcangeli, teve a participação de José Loguércio (aposentado do TRT da 4ª Região e mestre e doutor em Ciência Política), Celso Luiz Sá Carvalho (coordenador do Sindicato dos Técnicos da Universidade Federal do Rio Grande do Sul e ex-coordenador da Fasubra) e Maria Lucia Fattorelli Carneiro (auditora da Receita Federal durante 29 anos e coordenadora do movimento Auditoria Cidadã da Dívida, atuou na Comissão para a Auditoria Integral do Crédito Público do Equador, a convite do presidente Rafael Correa).
José Loguércio falou sobre os tipos de Estado, criado com a função fundamental de recolher e destinar os tributos e utilizar a força pública para efetivar a cobrança de impostos e manter a ordem. Com o capitalismo surgiu a Nação e o Estado passou a incorporar mais três funções, passando a ser indutor da produção, da ciência e da tecnologia (Portugal, com a escola de Sagres), responsável pelo incremento da escola e outros serviços públicos, além de defender a importância da soberania das nações no século 21. Veio, então, o neoliberalismo, com o domínio do capital rentista, para debilitar a soberania das nações. O estado de bem estar social na Europa, por exemplo, não volta mais. Outra questão defendida por Loguércio foi a definição dos sete órgãos centralizados de poder de Estado com sendo Executivo, Legislativo, Judiciário, Forças Armadas, Mídia, Igrejas e Bancos. Mesmo com este cenário, ele defende que, no Brasil, há um Estado em disputa.
Celso Luiz Sá Carvalho começou sua explanação fazendo a indagação de como está a correlação de forças entre as classes sociais e se é possível para a classe trabalhadora disputar o Estado. Segundo ele, a possibilidade de construção de um Estado socialista existe. Ele considera que, mesmo com um grande nível de contradição, o Brasil vive um Estado desenvolvimentista. A ideia da produtividade é central para a aplicação deste modelo capitalista e o Judiciário não foge a isso. Para provocar uma mudança, é preciso definir que tipo de Judiciário se quer. O caminho para isso parte da organização da categoria e do processo de trabalho, por meio da criação da carreira.
Maria Lucia Fattorelli Carneiro mostrou que a situação mundial do modelo capitalista atual está em crise, esgotado. Na Europa há jovens se suicidando por falta de esperança, aposentadorias cortadas pela metade e a sociedade está pagando a conta. E a cúpula da União Europeia continua a aprovar planos para manter o modelo. No Brasil, há um enorme paradoxo da sétima economia mundial que mantém uma educação de péssima qualidade e ocupa a 85ª posição no ranking do IDH (Índice de Desenvolvimento Humano). Entre as razões para esse paradoxo, está o fato de gastar 44% do orçamento para pagar juros e amortizações da dívida, que não é resultado de excesso de gastos, mas sim cresce em função dela mesma devido a juros absurdos. O Brasil está emitindo dívida para pagar juros.
Ao afirmar que a dívida do Brasil não para de crescer, Maria Lucia convidou a todos a participarem do seminário internacional “O Sistema da Dívida na Conjuntura Nacional e Internacional”, de 11 a 13 de novembro, em Brasília. Entre vários aspectos, o Seminário vai mostrar que os títulos da dívida pública são negociados com taxas muito maiores que a taxa Selic porque faz parte de um esquema mundial que é comandado por um restrito grupo de bancos. No Equador, por exemplo, o presidente Rafael Correa enfrentou os banqueiros e aumentou os gastos sociais com relação aos gastos com pagamento de juros da dívida.
Enquanto isso, no Brasil os servidores são massacrados com a reforma da Previdência feita por Lula nos moldes que FHC não havia conseguido, e pelo Funpresp, que é um risco para os servidores porque não define o retorno que os aposentados terão, já que dependerá do mercado. Com tudo isso, está mais do que evidente que para discutir carreira não se deve discutir somente salário. É preciso lutar pelo fim da privatização da estrutura de Estado e pela revisão das privatizações feitas por FHC. A democratização da mídia também é fundamental para que o país melhore.
Como mudar isso? Segundo Maria Lucia não existe mágica. É um processo histórico, que pode dar saltos a medida que as informações chegam à maioria das populações. Um dos caminhos é o enfrentamento da dívida. Para concluir, ela citou Marx: “a emancipação dos oprimidos será obra deles mesmos”.
Na segunda mesa, coordenada por Edmilton Gomes e João Batista, da direção da Fenajufe, “as diretrizes para construção de carreira, modelos de carreira e de remuneração”, foram debatidas a partir das palestras de Paulo Henrique Rodrigues dos Santos (integrante da coordenação geral da Fasubra) e Vera Lúcia Miranda (assessora do Sisejufe/RJ)
Henrique Rodrigues dos Santos disse que “não nos permitem participar nos processos de definição de funcionamento do serviço público, mas os servidores são responsabilizados pela população quando o serviço não é bem prestado”. Por essas e outras razões é que os servidores precisam lutar para interferir nos processos de gestão e nas políticas públicas. Com relação à carreira, ele afirmou que é preciso haver critérios objetivos definidos de ascensões funcionais, eliminando os critérios de pessoalidade. A sociedade precisa entender o papel do servidor público.
Vera Lúcia Miranda chamou a atenção para a necessidade de reforçar o alerta aos servidores sobre a questão de o Funpresp trabalhar com contribuição definida e não com remuneração definida, o que é terrível para o servidor. A discussão da jornada é outro problema, pois há jornadas informais muito maiores que a oficial sendo cumpridas por vários servidores para dar conta das metas cada vez maiores impostas pelo Judiciário. É preciso questionar o modelo de gestão que vem sendo imposto no Judiciário, com ajustes contínuos que precarizam cada vez mais o trabalho e proporcionam um adoecimento cada vez maior dos servidores. A gestão gerencial tem foco diferenciado entre ativos e aposentados e entre áreas fim e áreas meio, inclusive com o crescimento da terceirização.
Por último, foi realizado o painel sobre o resgate da discussão acumulada pela categoria, coordenado por Adilson Rodrigues e Maria Madalena Nunes, da direção da Fenajufe. Participaram Ramiro López, Vera Miranda e Démerson Dias (fundador do Sintrajud e da Fenajufe). Entre as questões discutidas nesse painel, estão vários pontos abordados no seminário anterior, sobre saúde.
Ramiro López lembrou que a luta pela careira vem há bastante tempo. Em 2007, o Congresso da Fenajufe definiu a luta pela criação de um plano de carreira. A discussão se arrastou por quase dois anos e surgiu, então, a proposta do plano de carreira aprovada em 2009 numa reunião ampliada convocada especificamente para este fim. Ao final de 2008, uma portaria do ministro Gilmar Mendes criou uma comissão para discutir a questão salarial, que contou com a participação de Ramiro como um dos representantes da Fenajufe. Segundo ele, apesar de a comissão ter sido criada para discutir salário, avançou bastante nas questões da carreira, mas o PL 6613 foi aprovada sem levar em conta toda a discussão feita pela comissão.
Na avaliação de Démerson Dias, “o ataque que estamos sofrendo do CNJ é estrutural e, com a realidade da tecnologia, o Poder Judiciário está a caminho de acabar com o quadro de servidores”. Não precisa nem lei para isso. Basta parar de abrir concurso público para preenchimento de vagas. O CNJ hoje é uma agência de despacho do capital e dos organismos internacionais. Isso não é por acaso. É um plano premeditado. E o PJe faz parte desse plano. Para Démeson, é preciso estabelecer um diálogo com a categoria para fortalecer a luta pela carreira de forma ampla, e não discutir a questão salarial como tema central da luta. A tendência é ser igual ou pior do que aconteceu com os bancários no que diz respeito à precarização do trabalho, a diminuição dos quadros e o aumento da terceirização.
Vera Lúcia destacou que nos dias 18 e 19 de novembro haverá um encontro do Judiciário para discutir gestão estratégia e traçar metas até 2020. O efeito dessa política de governança administrativa é muito devastador e certamente não virá boa coisa para os servidores nem para os juízes. A forma de gestão mudou e hoje todo o Judiciário é orientado pela política perversa criada pelo CNJ, piorando cada vez mais as condições estruturais.
Texto de Eduardo Wendhausen Ramos
Fotos de Joana D’Arc