Projeto cria “teste de integridade" para agentes públicos

Da série ataques ao funcionalismo público vem mais um capítulo. Inspirado nas recentes ações do MPF, o PL 3928/2015, do Deputado Indio da Costa (PSD/RJ), cria um “teste de integridade dos agentes públicos”. O relator da matéria na Comissão de Trabalho, de Administração e Serviço Público (CTASP), deputado Cabo Sabino (PR/CE), apresentou parecer pela rejeição do projeto. Mas, após votação na CTASP, a matéria vai agora à Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJC), para análise de mérito e constitucionalidade.

O projeto é surreal e a justificativa ainda mais. Estabelece, entre outras coisas, que a administração pública poderá submeter os agentes públicos a testes de integridade aleatórios ou dirigidos, cujos resultados poderão ser usados para fins disciplinares, bem como para a instrução de ações cíveis, inclusive a de improbidade administrativa e criminais. Os testes de integridade consistirão na simulação de situações sem o conhecimento do agente público, com o objetivo de testar sua conduta moral e predisposição para cometer ilícitos contra a administração pública.

Na justificativa, de deputado diz que “o Brasil precisa ser passado a limpo”: “Acredito numa nova forma de representação capaz de ouvir e entender as demandas da sociedade através da participação direta da população. A partir dos estudos da Lava Jato, liderados pelo procurador Deltan Dallagnol, o Ministério Público Federal elaborou o ‘10 Medidas´ anticorrupção, composto de 19 Projetos de Lei e 1 Proposta de Emenda à Constituição, para evitar a impunidade que atormenta o País. Em apoio ao MPF, a sociedade brasileira vem colhendo assinaturas para concretizar tais ideias e transformá-las em propostas que tramitem e sejam aprovadas pelo Congresso Nacional.”

Nessa linha, o deputado resolveu dar sua contribuição com um projeto que toma o servidor público como culpado até que prove sua inocência.

Veja abaixo o projeto e a justificativa:

O Congresso Nacional decreta:

 

Art. 1º Esta Lei cria o teste de integridade dos agentes públicos no âmbito da Administração Pública.

 

Art. 2º A Administração Pública poderá, e os órgãos policiais deverão, submeter os agentes públicos a testes de integridade aleatórios ou dirigidos, cujos resultados poderão ser usados para fins disciplinares, bem como para a instrução de ações cíveis, inclusive a de improbidade administrativa e criminais.

 

Art. 3º Os testes de integridade consistirão na simulação de situações sem o conhecimento do agente público, com o objetivo de testar sua conduta moral e predisposição para cometer ilícitos contra a Administração Pública.

 

Art. 4º Os testes de integridade serão realizados preferencialmente pela Corregedoria, Controladoria, Ouvidoria ou órgão congênere de fiscalização e controle.

 

Art. 5º Sempre que possível e útil à realização dos testes de integridade, poderá ser promovida a sua gravação audiovisual.

 

Art. 6º Os órgãos que forem executar os testes de integridade darão ciência prévia ao Ministério Público, de modo sigiloso e com antecedência mínima de 15 (quinze) dias, e informarão a abrangência, o modo de execução e os critérios de seleção dos examinados, podendo o Ministério Público recomendar medidas complementares.

 

Art. 7º Os órgãos de fiscalização e controle divulgarão, anualmente, estatísticas relacionadas à execução dos testes de integridade, bem como manterão, pelo prazo de 5 (cinco) anos, toda a documentação a eles relacionada, à qual poderá ter acesso o Ministério Público.

 

Art. 8º A Administração Pública não poderá revelar o resultado da execução dos testes de integridade nem fazer menção aos agentes públicos testados.

 

Art. 9º Os testes de integridade também poderão ser realizados pelo Ministério Público ou pelos órgãos policiais, mediante autorização judicial, em investigações criminais ou que digam respeito à prática de atos de improbidade administrativa.

 

Art. 10. A Administração Pública, durante a realização dos testes de integridade, poderá efetuar gravações audiovisuais ou registrar, por qualquer outro método, o que ocorre nas repartições públicas ou nas viaturas e nos carros oficiais, respeitado o direito à intimidade.

 

Art. 11. Aplicam-se as disposições desta Lei, no que couber, à Lei nº 12.846, de 1º de agosto de 2013.

 

Art. 12. Esta Lei entra em vigor 90 (noventa) dias após a sua publicação.

 

JUSTIFICATIVA

 

O Brasil precisa ser passado a limpo. Acredito numa nova forma de representação capaz de ouvir e entender as demandas da sociedade através da participação direta da população.

A partir dos estudos da Lava Jato, liderados pelo procurador Deltan Dallagnol, o Ministério Público Federal elaborou o “10 Medidas” anticorrupção, composto de 19 Projetos de Lei e 1 Proposta de Emenda à Constituição, para evitar a impunidade que atormenta o País.

Em apoio ao MPF, a sociedade brasileira vem colhendo assinaturas para concretizar tais ideias e transformá-las em propostas que tramitem e sejam aprovadas pelo Congresso Nacional.

Constitucionalmente, cada projeto de lei oferecido pela iniciativa popular precisa ser assinado por, no mínimo, um por cento do eleitorado nacional, distribuído pelo menos por cinco Estados, com não menos de três décimos por cento dos eleitores de cada um deles, sendo certa a dificuldade e burocratização do processo, fato que reclama alterações. 

Ao apoiar a iniciativa do MPF, percebi que estão colhendo uma só assinatura para o apoiamento de um bloco de projetos de lei, detalhe que -como a legislação obriga o apoio individual para cada proposta- poderia desperdiçar todo o esforço empregado.

Com a honra de ter sido instrumento da sociedade como relator e articulador da aprovação da Lei da Ficha Limpa, no Congresso Nacional, no intuito de contribuir com essa nobre causa e evitar uma possível desilusão dos envolvidos pela causa, pelo detalhe da regra, apresento tais medidas para que desde já o foco de todos nós se volte para dentro do Congresso onde essas medidas serão debatidas, eventualmente aprimoradas e certamente aprovadas.

 

Segue na íntegra a argumentação da proposta  feita pelo MPF:

 

Trata-se de iniciativa legislativa que almeja criar novo mecanismo voltado à defesa da moralidade pública.

Assim é que se pretende inovar o ordenamento jurídico para instituir o teste de integridade aos agentes públicos, de modo que sejam prevenidos atos de corrupção e comportamentos inadequados no serviço público e, particularmente, nos corpos policiais, tal como já realizado em grande extensão em outros países, a exemplo dos Estados Unidos da América, da Austrália, do Reino Unido, além da região administrativa especial de Hong Kong.

O objetivo central do teste de integridade é criar, preventivamente, a percepção de que todo o trabalho do agente público está sujeito a escrutínio e, a qualquer momento, a atividade pode estar sendo objeto de análise, inclusive sob o ponto de vista de honestidade. A realização do teste não parte da premissa da desconfiança sobre os servidores em geral, mas sim da noção de que todo agente público tem um dever de transparência e accountability, sendo natural o exame de sua atividade.

Prestigia-se, sob outra vertente, o Princípio Republicano, a partir do qual todos os agentes públicos devem prestar contas de sua atuação, e a Administração Pública deve velar pela correta e proba condução da coisa pública.

O teste de integridade dirigido é aplicado, então, no agente público em relação ao qual já houve algum tipo de notícia desairosa ou suspeita de prática ímproba, ao passo que os testes de integridade aleatórios refletem o princípio de que a atividade de qualquer agente público está sujeita, a qualquer tempo, a escrutínio.

O teste de integridade objetiva desencadear medidas proativas da Administração Pública para combater e prevenir a corrupção em situações enfrentadas corriqueiramente pelo agente público. Exemplo disso é o oferecimento de um valor módico, a título de propina, por um agente de corregedoria que, fingindo ser um cidadão comum, comete uma infração de trânsito e é parado por policial para ser multado. Há registro de resultados positivos em diversos locais nos quais esse tipo de teste foi e é utilizado, sendo recomendado até mesmo pela ONU e pela Transparência Internacional em relação às polícias. Além disso, esses dois organismos internacionais apontam que o conceito dos testes de integridade não precisa ser confinado às atividades policiais, daí que é possível aplicá-los em outros setores da Administração Pública.

Já na década de 70 do século XX, ao simular situações reais na cidade norte-americana de Miami, a ABC News providenciou a entrega de 31 carteiras contendo dinheiro e identidade para 31policiais, 9 dos quais subtraíram o dinheiro e foram penalizados.

Trinta anos depois, em Los Angeles e em Nova York, cidades nas quais as polícias aplicam, sistematicamente, testes de integridade nos policiais, a mesma rede de televisão distribuiu 20 carteiras para os policiais de cada cidade. Todas as carteiras foram devolvidas aos proprietários “sem nenhum centavo faltando”, a demonstrar que a criação de um ambiente de transparência e escrutínio, no qual o agente público pode ser testado a qualquer momento, tende a modificar o comportamento e a cultura de corrupção. Destaque-se também, no exemplo, que, se a própria imprensa pode aplicar, de modo lícito, testes de integridade, tanto mais pode fazê-lo a Administração Pública.

No caso do teste de integridade, embora pudesse haver alguma discussão jurídica quanto à viabilidade de processamento criminal (e não cível ou administrativo) da situação, em razão da tese do flagrante preparado, há posições doutrinárias e jurisprudenciais favoráveis à legitimidade da persecução criminal de condutas apuradas por meio de tais testes, desde que sua aplicação seja cercada de alguns cuidados.

De todo modo, independentemente de tal discussão na seara criminal, há precedente do Supremo Tribunal Federal rejeitando a tese do flagrante preparado no tocante à aplicação de sanção administrativa. Para proteger o servidor público, ressalte-se, é vedada pelo projeto a realização de testes que representem uma tentação desmedida, a qual poderia levar uma pessoa honesta a se corromper.

Com o mesmo objetivo, deverá ocorrer a comunicação prévia ao Ministério Público, informando-se a abrangência e os critérios de seleção usados, para aquela Instituição efetuar recomendações em 15 dias, se assim entender cabíveis. Além disso, para garantia do examinado, o teste deve ser sujeito à gravação audiovisual sempre que for possível.

Ante o exposto, é de suma importância a aprovação deste projeto, razão pela qual contamos com o apoio dos nobres pares.

 

Sala das Sessões,               de                    de 2015.

 

Dep. Indio da Costa

PSD/RJ