Reunidos nos dias 21, 22 e 23 de novembro de 2013, na sede do Sisejufe-RJ, os servidores do Poder Judiciário Federal e Ministério Público da União realizaram um amplo debate acerca da situação funcional do trabalhador negro na categoria.
Precedendo toda e qualquer deliberação, foram efetivados amplos e qualificados debates sobre a conjuntura política, social e econômica nacional com o fim de realizar um diagnóstico aproximado da realidade, o que possibilitou a indicação de ações possíveis para novas e promissoras conquistas, conforme o abaixo relatado e aprovado unanimemente por todos os participantes.
Nesse sentido, como é do pleno conhecimento dos companheiros, a categoria está vivenciando um período de enormes perdas, tanto salariais quanto políticas e sociais, pois o Brasil aderiu à tão propalada globalização, que é a implantação generalizada dos projetos de dominação ditados pelos xerifes do mundo, o império capitalista.
O país tem assistido a um grande avanço do capital, que em sua fase superior deixa um rastro de destruição e se impõe pela força, submetendo governantes, governos e a população mundial. Isso também é muito visível nas tais manifestações e passeatas instigadas pelas forças imperialistas, via redes sociais, e absorvidas, em especial pela classe média, que é submissa voluntariamente, comportando-se como verdadeiros abutres à espera dos restos abandonados pelas elites dominantes.
Nas tais manifestações democráticas o organograma é sempre o mesmo, ou seja, como comissão de frente vem uma horda de sociopatas de todo gênero, destruindo qualquer coisa por onde passam, amparados por uma massa majoritariamente despolitizada formada por descontentes e oportunistas de todos os matizes. Isso é o início da fase superior do capitalismo. Como bem adjetivam os mais nobres pensadores, a barbárie está presente. Essa horda não carrega qualquer bandeira que signifique a ruptura com o sistema. Não há faixas dizendo “fora imperialismo”, fora neoliberalismo”, “fora capitalismo” ou “socialismo já”, “por um Brasil socialista”. Não abrem mão, em momento algum, do novo liberalismo excludente e perverso. E raramente se vê um negro ou um operário nas tais manifestações.
Em meio a esse deprimente quadro, os representantes do povo propalam a legitimidade dessas ações predatórias, o crescimento da oposição, mais liberal e cruel do que o atual governo, a velha conhecida que é diuturnamente propagandeada pela mídia burguesa que invade os lares brasileiros e que, subliminarmente, aponta os Aécios/Serras, os Eduardos e as Marinas como saída para todos os problemas. Longe, mas muito longe mesmo de imaginar que o governo atual é o ideal, não se pode confundir menos pior com melhor. O atual governo é neoliberal, pois sua política assim o é, assim como todos os seus aliados, indistintamente. A eterna desculpa para as concessões ao imperialismo é a eterna correlação de forças desfavorável, eterna desculpa para lavarem suas mãos sempre sujas e seguirem tentando consertar o capitalismo.
O episódio das escutas estadunidenses é o retrato da ingestão direta no país, mas a resposta do presidente lacaio que disse que usarão de todos os meios para atingir seus objetivos, expôs ao mundo quem realmente ele é, o que e quem representa.
Ao saber um pouco do que é preciso enfrentar e derrotar, foi dado início ao debate sobre o conjunto de reivindicações necessárias, com a natureza guerreira à disposição para muitas batalhas, como foi o caso dos Lanceiros Negros no RS e dos inúmeros quilombolas de nossa pátria, cujo principal líder foi Zumbi dos Palmares.
Cumpre aqui ressaltar que os Lanceiros Negros foram os verdadeiros soldados da tão falada Revolução Farroupilha, que não passava de uma disputa econômica entre a burguesia agrária gaúcha e a fidalguia portuguesa. Aos negros gaúchos escravizados, caso lutassem ao lado dos “revolucionários” (fazendeiros) foi prometida a alforria e a posse de terras ao final, sendo que o genocida Davi Canabarro, bancado pelo sanguinário Bento Gonçalves, matou todos os soldados negros (os Lanceiros Negros) ao formalizarem um acordo econômico com a burguesia imperial em 1845. Fato semelhante ocorreu no Piauí, Maranhão, Rio de Janeiro, Bahia e outros estados. A história mostra que pontualmente existem alianças entre opressores e oprimidos. Porém, fatalmente quando os opressores atingem seus objetivos eles voltam a ter a mesma política com relação aos oprimidos.
Há vários companheiros negros que hoje labutam no Judiciário Federal, que ingressaram no serviço público, via concurso também público, numa condição de igualdade com milhares de não negros, sendo que estes últimos, em sua imensa maioria, desfrutam de apoio econômico e financeiro, o que lhes proporciona as ideais condições de preparo para uma disputa tão acirrada. Como diria um humilde e sábio companheiro: “enquanto nós negros trabalhamos durante o dia para comer à noite, os filhos deles estudam pela manhã na escola privada, à tarde no melhor cursinho e à noite nos seus computadores de última geração”.
O Brasil jamais poderá esquecer que grande parte de sua população é descendente direta de um povo escravizado pelos não negros na constituição desta Nação, que conquistaram a libertação com muita luta e sacrifícios. Dentre os exemplos de lutas há os quilombos e, no sacrifício, o suicídio que também era uma forma de libertação além dos interesses econômicos do império. Os negros foram barrados de qualquer tipo de aprendizado escolar, até mesmo de alfabetizar-se, perdurando essa prática até parte do século anterior.
As ações afirmativas existem há muito tempo no Brasil, os imigrantes quando chegaram tinham direito à terra e isenção de impostos. As mulheres na legislação política têm direito a cotas, o mesmo ocorrendo com os portadores de necessidades especiais. Os negros e índios tiveram ações negativas, sendo-lhes proibido o direito à terra, propriedade privada e até mesmo o acesso ao ensino público.
Esses são os fundamentos para a primeira reivindicação, ou seja, objetivamente propugnar pelas cotas para ocupação dos cargos em todos os concursos de ingresso no Judiciário Federal (30% em todos os níveis) tendo como parâmetro mínimo os percentuais que forem atribuídos aos demais poderes da União.
É preciso também dizer que o percentual de negros detentores de Cargos em Comissão e de Funções Comissionadas é quase negativo no Judiciário e MPU. A maioria esmagadora dos negros que conseguiram ingressar, com todas as dificuldades que lhes são impostas, já na carreira foi aos bancos universitários e é possuidor de bacharelado, mestrado e até doutorado, todavia quem ocupa os cargos de maior remuneração são os não negros, sendo que alguns sequer possuem o ensino superior completo.
Os critérios para acesso a esses cargos, funções e salários têm caráter subjetivo, ficando a sociedade submetida ao humor ou às simpatias e preferências pessoais do administrador (juiz ou diretor), que usa livremente o erário público para remunerar os seus seguidores, sendo muitos deles seus parceiros políticos e ideológicos. É preciso exigir concurso interno para ocupação desses cargos/funções, com preparo prévio nas escolas judiciais e de governo (públicas e gratuitas) bem como capítulo específico no projeto de lei do Plano de Carreira que se avizinha. Essa, então, é a segunda reivindicação, a aplicação de 30%, a título de cotas para negros, em concursos internos para ocupação dos cargos em comissão e funções comissionadas em todos os setores de cada tribunal.
A seguir, é preciso implantar, prioritariamente, até para que não se perca o foco do debate feito no último Congresso e Plenária estatutários da Fenajufe, as cotas nas chapas concorrentes (delegações para reuniões, seminários, plenárias e congressos) e na ocupação dos cargos nas direções sindicais, em todos os níveis, obedecendo a propositura já debatida e aprovada, também no percentual de 30%.
O debate acerca do Plano de Carreira é urgente e necessário, e em assim sendo, todos estão convidados para uma ação organizada e efetiva, realizando a ingerência necessária para a obtenção da vitória de seus pleitos, tanto na elaboração, quanto na aprovação da lei que organizará e ordenará a carreira enquanto servidores públicos do Poder Judiciário Federal e Ministério Público da União.
Uma das principais deliberações foi de que está criado o Coletivo Nacional da Fenajufe de Combate ao Racismo, que será submetido à direção executiva da Federação para sanção em sua primeira reunião. A ideia é de que o coletivo tenha suas reuniões ordinárias no dia que antecede todas atividades nacionais da categoria, tais como reuniões ampliadas, atos nacionais, plenárias e congressos. Foi apontada ainda a necessidade de realizar uma pesquisa nacional que indique o perfil racial e funcional dos trabalhadores da categoria, em especial dos servidores negros.
Fica sugerida a realização do 2º Seminário Nacional de Combate ao Racismo e Identidade Negra, em 2014, neste mesmo período, na cidade de São Luiz, reivindicado pelos representantes maranhenses presentes e que será apoiado em todos os sentidos, também reivindicado, pelos companheiros do Sindjus-DF, sendo que todas as convocatórias atinentes ao coletivo deverão ser efetuadas pela nossa Federação.
No encerramento, foi feita uma calorosa saudação à direção da Federação pela inédita e necessária realização deste evento, em especial à diretoria do Sisejufe-RJ que acolheu o conjunto dos trabalhadores, oportunizando a riqueza de debates e decisões aqui tomadas e que vêm ao encontro do conjunto de ações afirmativas que elevarão o povo negro e repararão em parte os danos causados desde seu sequestro no continente africano. O seminário deixou a todos o desejo de muita saúde, muita alegria, pois os lutadores das causas populares precisam estar em sua plenitude para enfrentar os donos dos meios de produção, as elites dominantes e os entreguistas de todos os matizes.
Propostas do Seminário para encaminhar à direção da Fenajufe
1 – Criação do Coletivo de combate ao Racismo, com a indicação de que ocorra preferencialmente no primeiro semestre de 2014 ou junto com a primeira reunião ampliada;
2 – Criação de cotas nas Fcs e CJs de 30% ou no mínimo o percentual indicado na legislação do Poder Executivo, sendo que os participantes do seminário indicam o percentual de 30%;
3 – Realização, pela Fenajufe , de uma pesquisa nacional, a fim de traçar o perfil racial dos trabalhadores do judiciário federal e MPU;
4 – Realização do 2ª Seminário de Raça na cidade de São Luís (MA), na Semana da Consciência da Negra de 2014, com organização dos sindicatos do Maranhão e de Brasília;
5 – A convocatória para o evento será feita pela Fenajufe.
Fonte: Sisejufe, com revisão da Fenajufe (Eduardo Wendhausen Ramos)