Havia sido marcada para esta sexta (1o) a chegada ao Paraguai dos primeiros 400 militares americanos de um contingente ilimitado de marines que foi autorizado pelo Congresso a fazer manobras e treinamentos no país. A decisão de permitir a entrada e de outorgar aos soldados dos EUA imunidade total e status diplomático foi tomada no final de maio, e prevê a permanência dos americanos até final de 2006, prazo que pode ser automaticamente prorrogado.
À época da assinatura do acordo, a ministra das relações exteriores, Leila Rachid, afirmou que “os soldados [americanos] terão as mesmas prerrogativas que os funcionários técnicos ou administrativos de delegações diplomáticas que capacitam nossos compatriotas”, e que a imunidade total só seria dada àqueles “que trabalharem com causas humanitárias”. Isso significa que, em caso de delitos cometidos pelos soldados, eles não poderão ser punidos nem levados à Corte Penal internacional, à qual o Paraguai aderiu.
As negociações com os EUA também garantem a entrada e saída livre das tropas, transporte de armas e medicamentos, e a liberdade total para operar em qualquer ponto do território, segundo matéria do jornal argentino Clarín.
Segundo o jornalista argentino Luis Bilbao, correspondente do jornal francês Le Monde Diplomatique, a decisão do Congresso paraguaio se deu logo após a queda do presidente boliviano Carlos Mesa e da exigência americana na OEA (Organização dos Estados Americanos) – não aceita – de que se criasse um “observatório das democracias” no organismo. Também acontece no momento em que o governo paraguaio trava uma batalha com movimentos sociais e oposição, contrários às privatizações em curso no país, e com movimentos camponeses em luta por terras.
“Washington deve formalizar agora uma base militar no Paraguai (onde, há anos, os EUA já mantém uma aeroporto semi-clandestino em Mariscal Estigarribia, povoado na regia do Chaco, perto da fronteira com a Bolívia, onde se pode aterrissar aviões B-52 e Galaxys, capazes de transportar grandes quantidades de tropas e armamentos) e crava aí um alicerce estratégico para controlar os movimentos de convergência sul-americanos”, avalia Bilbao.
Neste mesmo sentido, ONGs argentinas denunciam que o principal alvo dos militares norte-americanos será a região da Tríplice Fronteira (divisa entre Brasil, Argentina e Paraguai), que, segundo avaliação do jornal mexicano La Jornada, é o ponto chave dos projetos geoestratégicos americanos para controlar, com tropas de rápida mobilização, os países fronteiriços e implementar a “Guerra de Baixa Intensidade” contra os inexistentes terroristas supostamente entrincheirados na região.
Para preparar terreno, o secretário de Defesa dos EUA, Donald Rumsfeld, já garantiu que promoverá, em setembro próximo, um seminário de planejamento se segurança integral nacional com especialistas do Centro de Estudos Hemisféricos de Defesa, órgão ligado diretamente ao Pantágono. Mas já nesta sexta, o embaixador americano no Paraguai, John Keane, anunciou uma ajuda financeira vultuosa ao país “para o combate ao tráfico de drogas, ao terrorismo, à lavagem de dinheiro e à corrupção”.
Brasil ameaçado?
Ter tropas americanas atuantes em dois flancos – no norte pela Colômbia e no sul pelo Paraguai – não deixa o Brasil em uma situação confortável. A análise é do deputado federal Dr. Rosinha (PT-PR), ex-presidente da Comissão Parlamentar do Mercosul. “A militarização das fronteiras é muito perigosa, estamos começando a ficar imprensados, e acredito que isto seja uma ameaça à nossa segurança”, afirma.
Segundo o deputado, mesmo desconhecendo qualquer legislação que impeça o Paraguai de abrir seu território a forças externa, deveria ter havido uma discussão da questão no âmbito do Mercosul. “Os EUA ganharam a queda de braço contra a resistência de sua presença na Tríplice Fronteira. Não sei como foi o acordo com o Paraguai. Mas com a Colômbia aconteceu que se restringiu a entrada de militares e permitiu-se o acesso livre de civis norte-americanos. Esse civis são todos mercenários, empresas privadas de segurança. Se isso se repetir no Paraguai, as coisas se complicam”.
Já a assessoria do Itamaraty afirmou que, oficialmente, o Brasil não se manifestara sobre o assunto, porque “seria ingerência em assuntos internos de outro país. Nós mesmos temos acordos de exercícios militares conjuntos com os EUA, e do ponto de vista do Itamaraty não há nada a ser comentado”.
Fonte: Agência Carta Maior