Michael Geekinuai é um dos cerca de cem quenianos que desocupou alguns quartos de sua casa, em um condomínio fechado de Nairobi, para abrigar os participantes do 7º Fórum Social Mundial. Recebe US$ 35 por cabeça.
Oferece em troca, além das camas, uma refeição matinal com café solúvel e porções de lingüiça, ovos cozidos, cebola e tomate.
Ao saber a nacionalidade dos seis novos ocupantes da casa, lembra imediatamente: “Rio, Rio, armas, armas”, diz com os olhos arregalados e imitando pistolas em cada mão. Mais uma pergunta e descobre que parte dos visitantes tem origem paulista. “Buraco, buraco, eu vi o grande buraco lá”, referindo-se à cratera aberta por acidente nas obras do metrô paulistano.
Que mais sabia sobre o Brasil? “Teve um encontro agora lá, com [Hugo] Chávez. Ele está forte, mas isso é perigoso. Os Estados Unidos não vão deixar ninguém forte na América Latina”, analisa, em referência à Cúpula do Mercosul, realizada no Rio de Janeiro, semana passada.
Michael soube do buraco paulistano, dos tiros cariocas e de Chávez pelas imagens que recebe, via cabo, das tevês norte-americana CNN e britânica BBC. Não conhece nenhum veículo de comunicação brasileiro. No canal inverso, entre os seis brasileiros hospedados em sua casa, poucas informações sobre tribos quenianas, safári e os recordes do país no atletismo.
“Informação é quando, horizontalmente, enviamos e recebemos mensagens uns para os outros. Fazer essa distribuição de forma igualitária é muito difícil num mundo em que a informação passa por gatekeepers [vigias, em inglês]”, afirma o uruguaio radicado na Itália Roberto Sávio, em sua participação no 2º Fórum Mundial da Comunicação, realizado hoje (22), em Nairóbi.
A agência que Sávio dirige, Inter-Press Service (IPS) é, segundo ele, uma tentativa de divulgar informações sobre os países do Sul do planeta para “evitar que saibamos uns dos outros pelo Washington Post”.
No debate do qual Sávio participou, mais do que o diálogo entre os países do Sul, foram discutidas formas de melhorar a comunicação entre o próprio Fórum Social e o resto da sociedade.
“Há um mundo de assuntos no Fórum Social, mas precisamos de uma mensagem simples para disparar no ar e chegarmos às pessoas comuns”, argumentou o jornalista David Byarugaba, que abandonou seu emprego na UBC, canal estatal de Uganda, para transformar-se em produtor independente de vídeos sobre o movimento camponês de seu país.
Na tarefa de construir esta “mensagem simples”, os jornalistas têm um importante papel, acredita a repórter brasileira Cristina Charão, militante do grupo de luta pelo direito à comunicação Intervozes. “A comunicação é necessária para construir outro Fórum Social. E nisso, nós, jornalistas, temos de agir não só como repórteres, mas como atores políticos.”
Fonte: Agência Carta Maior