EUA avançam sobre América Central

Enquanto avançam na América do Sul, fincando bases no Paraguai e na Colômbia, os Estados Unidos não descuram de seus interesses históricos na América Central. Da mesma forma que tentam impor a ALCA no Sul, encaminham a implantação da proposta de Acordo de Livre Comércio com a América Central e a República Dominicana (Cafta-DR, da sigla em inglês). No dia 30 de junho, o Senado dos Estados Unidos aprovou a proposta. Desde então, os movimentos sociais do país e da América Central entraram em conflito aberto com o governo Bush.
Costa Rica, El Salvador, Guatemala, Honduras, Nicarágua, República Dominicana e Estados Unidos formariam o novo bloco, que, se for ratificado, pode ser ampliado para mais países da subregião. Este mês, o Congresso estadunidense deve aprovar ou rejeitar o acordo, peça central para a estratégia de Bush para a América Latina, pois lhe garante mais controle sobre uma região do continente. Para movimentos sociais estadunidenses e centro-americanos, o tratado fere direitos trabalhistas e acentua o domínio das grandes corporações sobre a América Latina (veja abaixo).

Mobilizações

No relatório “Por que nos opomos ao Cafta-DR”, publicado pela entidade estadunidense Oakland Institute, em junho, o acordo é definido como “nefasto”, pois “promete melhorar as condições dos trabalhadores, mas só vai trazer desemprego e perda de direitos”. No documento, a entidade conclama organizações sociais a realizar campanhas de informação dos deputados estadunidenses que vão votar a proposta.
A estratégia da Coalizão Pare o Cafta-DR, que reúne centenas de movimentos sociais e entidades dos Estados Unidos e América Central, tem por alvo os deputados estadunidenses. Na página na internet da Coalizão – www.stopcafta.org – há modelos de cartas que podem ser enviadas para os parlamentares, com argumentos contra o acordo, destacando seu impacto nos trabalhadores estadunidenses, principalmente o crescimento da taxa de desemprego. A análise dos efeitos do tratado se baseia nos do Acordo de Livre Comércio da América do Norte (Nafta, da sigla em inglês), que une Canadá, Estados Unidos e México.
Nos países da América Central, protestos ocorrem semanalmente. Eles criticam a tomada de partido dos governos centro-americanos, que se posicionam a favor do Cafta-DR. E exigem a realização de um referendo para que a população possa decidir sobre o tratado. Em El Salvador, Guatemala e Honduras, o acordo já foi aprovado. Na Nicarágua e República Dominicana, segundo a Coalizão, o tratado deve ser aprovado. Na Costa Rica, foi rejeitado em dezembro de 2004, mas pode ser levado a nova votação.

Ações de Bush

De seu lado, o presidente dos Estados Unidos faz uma campanha de convencimento dos parlamentares de seu país. Em aparições televisivas cada vez mais freqüentes, ele defende o Cafta-DR, argumentando que pode proporcionar mais crescimento econômico aos EUA.
“É uma oportunidade histórica, pois garante o acesso das empresas dos Estados Unidos a um mercado de 44 milhões de pessoas”, disse, em um discurso oficial, citado pelo Oakland Institute, referindo-se à população centro-americana.
Em maio, na mesma campanha, Bush organizou uma missão que trouxe os presidentes dos países que negociam o Cafta-DR a Washington, capital dos Estados Unidos. Os chefes de Estado foram ao Senado e discursaram em defesa do acordo. Participaram da missão Abel Pacheco (Costa Rica), An- camponetonio Saca (El Salvador), Oscar Berger (Guatemala), Ricardo Maduro (Honduras), Enrique Bolaños (Nicarágua) e Leonel Fernández (República Dominicana).

Resultado do acordo: ganham as corporações

Geopolítica – O Produto Interno Bruto (PIB) dos países centro-americanos representa 0,5% do PIB dos Estados Unidos, estimado em 11,7 trilhões de dólares. O Acordo de Livre Comércio com a América Central e a República Dominicana (Cafta-DR, da sigla em inglês) se caracteriza por assimetria entre os signatários. O tratado privilegia os interesses do governo estadunidense, que defende os das grandes empresas do país.
Efeito multiplicador – O Cafta-DR é considerado como um ensaio da Área de Livre Comércio das Américas (Alca), acordo com o qual o presidente George W. Bush pretende unificar todos os países americanos, menos Cuba, em um bloco econômico. Segundo relatório da entidade estadunidense Washington Office on Latin America, Bush pode usar a ratificação do Cafta-DR para pressionar outros países latino-americanos a assinar acordos de livre-comércio.
Domínio das corporações – Como acontece com o Acordo de Livre Comércio da América do Norte (Nafta, da sigla em inglês), que une Canadá, Estados Unidos e México, o Cafta-DR permite que corporações processem governos que atuem ou instaurem leis que limitem seus lucros. Após a ratificação do Nafta, o governo canadense foi processado por impedir que transnacionais estadunidenses explorassem reservas de água do país. As empresas dos EUA estavam contaminando as reservas.
Serviços públicos – O acordo sub-regional entre países centro-americanos e Estados Unidos garante a liberalização de serviços públicos, como educação e saúde. Assim, nos países que adotam a universalização do atendimento, haverá privatização dos serviços, processo que deve ser estendido, aponta o texto do Cafta-DR, a empresas públicas e de recursos naturais.
Trabalho – O Cafta-DR não cria uma referência comum para direitos trabalhistas. As grandes empresas estadunidenses vão poder se instalar em países que não garantem benefícios aos trabalhadores. Nos Estados Unidos, o desemprego urbano e rural vai aumentar. Sindicatos e entidades que protestam contra o acordo são sistematicamente reprimidos, tanto nos países centro-americanos quanto nos EUA.
Dívida – Entidades centro-americanas exigem que, no acordo sub-regional, seja negociada a dívida externa dos países da região. Temem que a dívida se torne um meio de manipulação do governo dos EUA. Por enquanto, os presidentes dos países centro-americanos e Bush não sinalizaram para uma eventual negociação. A soma das dívidas de Costa Rica, El Salvador, Guatemala, Honduras, Nicarágua e República Dominicana é de 32 bilhões de dólares.

Fonte: Brasil de Fato e agências de notícias