Estudantes reagem contra ‘campanha’ para criminalizar ocupação na USP

Preocupados com o risco de haver perseguição política aos que participaram da ocupação à Reitoria da USP (Universidade de São Paulo), os universitários planejam divulgar uma nota oficial para esclarecer as acusações de vandalismo e furto de que tem sido alvo nos últimos dias. Dois alunos que fizeram parte da Comissão de Imprensa da ocupação informaram que a nota poderia ser aprovada ainda nesta quarta (27) em uma assembléia da FFLCH-USP (Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras Humanas).
A apuração do Instituto de Criminalística de São Paulo (IC), realizada no sábado (23), divulgou que a ocupação deixou salas com móveis e objetos espalhados, uma copiadora quebrada, um computador desmontado no banheiro e documentos desaparecidos da sala do vice-reitor, Franco Maria Lajolo, bem como bastante lixo no local.
Um dos alunos, que esteve na Reitoria e não quis se identificar, enviou fotos à Carta Maior de dentro do prédio nos instantes finais da ocupação. Elas registram o esforço pela limpeza do local e também para reorganizar móveis, computadores e documentos em salas no andar térreo e no primeiro andar. Nas imagens, dois representantes da Reitoria percorrem salas ao lado dos estudantes para uma vistoria.
Diogo Campanhã, estudante de História da USP, desmente a versão apresentada pelo IC. “O computador não estava no banheiro quando saímos do prédio. Este cenário foi montado por alguém que esteve na Reitoria depois que nós saímos”. Ele ainda afirma que os papéis retirados da sala de Franco Maria Lajolo estão guardados nos armários e gavetas, bem como os aparelhos de telefone e computadores. “Trancamos tudo em uma sala para garantir que estariam seguros. Passamos correntes nas portas para evitar vandalismos e furtos”.
O professor de Artes Plásticas da ECA-USP (Escola de Comunicação e Artes) Luiz Martins esteve no grupo de cinco intelectuais que negociou com a Reitora Suely Vilela e foi um dos responsáveis por garantir a assinatura o termo de compromisso. Segundo ele, que esteve no prédio da Reitoria horas antes do fim da ocupação, tudo parecia estar preservado.
“Em toda multidão há um ou outro gesto que foge à maioria e pode levar a estragos”, diz Martins, reconhecendo que pode ter havido furtos. “Mas não precisa haver uma sublevação política para existir vandalismo. Estão aí os orelhões e as paredes das unidades que não me deixam mentir”. Para o professor de Artes Plásticas, o acordo assinado com a Reitora exige que a culpa seja “individual para que haja punição”, mas a imprensa “nem se importou com isso e agora tenta fazer uma campanha para desqualificar e perseguir os estudantes”.
Natália Pimenta, que é aluna de Letras, parece indignada com a postura da Reitora de querer punir os estudantes. “A defesa do ensino público é maior do que um computador quebrado”, diz ela, referindo-se a uma “campanha” da Reitoria para criminalizar os estudantes. “Tenho quase certeza de que as punições por danos materiais vão se tornar perseguição política”.

Investigação

A Polícia Civil de São Paulo instaurou um inquérito criminal para investigar os crimes de furto e danos ao patrimônio público na Reitoria. A investigação será chefiada pelo delegado Ricardo Afonso Rodrigues, titular do Setor de Investigações Gerais (SIG) da 3ª Delegacia Oeste de SP. Segundo o delegado, os estudantes serão identificados pelas reportagens e fotos publicadas na imprensa e pelas imagens feitas pelo circuito interno de câmeras do edifício.
A reitora Suely Vilela declarou, nesta quarta (27), que o termo de compromisso não inclui ações que ultrapassaram o limite do exercício de greve e protesto. Roubos e vandalismos devem sofrer punições. Segundo a Reitora, houve danos ao patrimônio durante a ocupação, que incluem “muitos furtos de laptops, monitores, projetor multimídia, impressora, scanner, componentes de informática, DVD Player, pen drives, microfones e algumas máquinas também”. Suely afirmou ainda que há depredações no forro do teto e nas paredes do prédio.
Entrevistados durante uma assembléia ocorrida na noite de terça (26), alunos explicam que havia uma Comissão de Segurança na ocupação para impedir furtos e vandalismo. Apesar disso, não foi possível impedir todos os casos. “Até onde sei, houve um monitor roubado e uma impressora quebrada”, afirma Guilherme Balza, aluno de Jornalismo da USP. “Mas os furtos foram poucos, perto do tamanho da mobilização dos alunos para preservar a reitoria”.
“Se houver forma de identificar os responsáveis, eles tem que ser punidos individualmente”, afirma o estudante de Ciências Sociais André Kaysel. Para ele, a imprensa e a Reitoria têm superestimado os casos de vandalismo e de roubos, como forma de atacar os alunos depois que a ocupação terminou. “Eles estão isolando os setores progressistas da universidade, porque se sentiram derrotados na negociação com os estudantes”.
Diego Veiga, aluno do 2° ano das Ciências Sociais e diretor da Amorcrusp (Associação de Moradores do Crusp), diz que era impossível revistar todos os alunos que entravam e saíam do prédio da Reitoria, e admite que podem ter havido furtos. “Mas não pode haver uma punição coletiva, porque o movimento estudantil não compactua com estes roubos”, diz ele.
Alunos do grupo que negociou com a reitora Suely disseram que ela desrespeitou um acordo firmado com eles. Uma comissão paritária, que incluía porta-vozes dos alunos, funcionários e da Reitoria, foi escolhida para fazer a primeira vistoria ao prédio, na segunda (25). “Não incluímos esta comissão no termo assinado pela Reitora porque isso já havia sido garantido por ela em muitas reuniões”, diz Carlos Gimenes, aluno de Ciências Sociais que esteve nas negociações. Entretanto, não houve convocação da comissão, porque a Reitoria autorizou, dois dias antes, que os peritos do Instituto de Criminalística fossem ao prédio fazer vistoria.

Fonte: Carta Maior