A Fenajufe realizou, nos dias 06 e 07 de agosto, em formato híbrido, o Encontro do Coletivo Nacional de Saúde (Consaúde) para discutir teletrabalho, assédio moral e sexual e condições de trabalho. Pelo Sintrajusc participaram as coordenadores Denise Zavarize e Maria José Olegário, o coordenador Paulo Borba e a Oficiala de Justiça na VT de Xanxerê Ana Carolina Lucena Pinheiro. Todas as propostas aprovadas no encontro serão sistematizadas e remetidas à direção da Fenajufe.
Para Ana Carolina Lucena Pinheiro, o encontro foi muito agregador em questões técnicas, com palestras relevantes e fundamentadas, mas principalmente na vivência com os colegas: “Havia pessoas de todo o Brasil, de tribunais e ramos diferentes da justiça. Essa diversidade agregou muito, pois, conforme abordado, o isolamento e falta de apoio mútuo são fatores que agravam doenças. Foram abordados temas como aumento das doenças de origem psíquica, bem como aumento do alcoolismo e uso de medicações após a pandemia, fenômeno que vinha acontecendo ao longo dos anos, mas se agravou e se tornou mais evidente. Eu entendi o conceito de assédio institucional, que, através de metas e cobranças excessivas, causa o adoecimento dos servidores. Vivi também momentos de acolhimento mútuo entre os colegas, o que foi muito bonito de se ver e ouvir, e nos dá esperança de que possamos continuar lutando, com e por outros seres humanos”.
Propostas
Nas falas, a necessidade de uma forte atuação em defesa da saúde das servidoras e servidores. Entre as propostas, a criação do Coletivo Nacional de Saúde com um representante titular e um suplente da base da Federação, nos termos do estatuto aprovado no 11º Congrejufe. Esse coletivo elegerá uma comissão nacional que contará com coordenações por região. Após constituída a comissão, as reuniões serão online, com a periodicidade definida pelos seus membros.
Além disso, realizar um mapeamento da criação, funcionamento e participação das entidades sindicais da base da federação nas comissões derivadas das resoluções do CNJ que são afetas às condições e relações de trabalho e um pesquisa Nacional do PJU e MPU em conjunto com a Federação Nacional dos Trabalhadores do Judiciário nos Estados (Fenajud) para mensurar o adoecimento da categoria, efeitos da ampliação do trabalho remoto, sob confinamento ou não, e da Covid-19 para propor políticas de saúde do trabalhador e gestão do trabalho que erradiquem os efeitos de acordo com o resultado da referida pesquisa.
Outra proposta foi solicitar ao CNJ/ STF, CNMP/MPU e aos tribunais superiores e procuradorias a criação da Comissão Nacional de Saúde e Condições de Trabalho.
Os e as participantes também indicaram apoio ao PL 4567/21, do deputado Marcelo Freixo (PSB-RJ), que altera a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e a Lei nº 8.112/90, que dispõe sobre o regime jurídico dos servidores públicos civis da União, das autarquias e das fundações públicas federais, para instituir o direito à desconexão do trabalhador e do funcionário público, para regular o uso de ferramentas digitais após a jornada diária e após os dias úteis.
Debates
Abrindo os debates, a assessora técnica da Federação Vera Miranda apresentou os eixos definidos pela 11ª Diretoria Executiva sobre o tema: questão do teletrabalho (direito à desconexão, dificuldade de comprovar o nexo causal, doença em decorrência do trabalho e a transferência de gastos para o servidor); assédio moral e sexual; condições de trabalho.
Vera pontuou que sem examinar as questões de relação e condições de trabalho e gestão da carreira, não há como discutir a saúde. Também abordou o mapeamento nacional que a Fenajufe está fazendo sobre o funcionamento de comitês e comissões relativos ao tema e que são objeto de regulamentação do Conselho Nacional de Justiça (CNJ): se estão funcionando e se tem participação dos sindicatos, para que a Federação possa intervir.
A assessora falou, ainda, sobre a restruturação do PJU atrelada à discussão sobre a residência jurídica e o enfrentamento dessa discussão de precarização. Miranda frisou, também, que para tratar de todas essas discussões, a partir desse encontro será criado o Coletivo Nacional de Saúde, com representação dos sindicatos, permanente, que funcionará de forma online.
UrgenteMENTE
Em seguida, o encontrou contou com a participação da coordenadora executiva da Federação Nacional dos Trabalhadores dos Ministérios Públicos Estaduais – (Fenamp), Erica Oliveira, que falou da campanha UrgenteMENTE da entidade sobre saúde mental.
Em 2021, disse Oliveira, o Conselho Nacional do Ministério Público, o CNMP apresentou os resultados da pesquisa “Atenção à Saúde Mental de Membros e Servidores do Ministério Público: Fatores Psicossociais no Trabalho no contexto da pandemia de Covid-19”, que trouxe o diagnóstico real a respeito do adoecimento dos servidores.
Os resultados revelaram que 85,6% dos participantes encontravam-se em risco de adoecimento mental. Esses resultados foram base para proposição de uma Política Nacional de Atenção Continuada à Saúde Mental no âmbito do Ministério Público Brasileiro pela Comissão de Saúde do órgão. Apesar da urgência da aprovação da proposta de resolução, o tema parado no CNMP.
Nas intervenções dos participantes, pontos cruciais de atenção para servidoras e servidores como o modelo de gestão produtivista ditado pelo CNJ e CNMP — que não respeita os limites físicos e nem psicológicos — com metas de produtividade que sobrecarregam os trabalhadores; adoecimento; saúde mental; condições de trabalho; modos de gestão; assédio moral.
Assédio moral e sexual
No painel “Assédio Moral, Assédio Sexual – Ferramentas da Gestão de Produtividade no PJU e MPU?”, com a professora do Departamento de Psicologia Social e do Trabalho da Universidade de Brasília (UnB), Ana Magnólia, ela afirmou que hoje vivemos a “era do assédio organizacional”, considerando o que sustenta essa prática, que são os modos de gestão produtivista, especialmente os de certificação de qualidade total, e que são a base das situações de assédio organizacional.
Magnólia alerta e constata que a visibilidade, hoje, para os casos de assédio, tem se tornado difícil de ser identificada e diagnosticada considerando que o assédio é organizacional, institucional — violência instituída oficialmente, legitimada, aplicada e perpetuada pelos modos de gestão, gestores e até pelos próprios servidores. Sobre o teletrabalho, Ana Magnólia apontou que é o modo atual de reprodução do capital, que tem seus modos de gestão: capital industrial, de serviços, financeiro e, agora, digital. E existe uma estratégia, continuou a professora, para que essa modalidade se perpetue de modo que enfraqueça o movimento dos trabalhadores e a possibilidade de construção do coletivo para que o domínio seja feito de uma maneira muito mais fácil, confortável, através de um controle remoto.
Sobrecarga e adoecimento
A mesa sobre “Condições de Trabalho: Hiperconexão, sobrecarga e adoecimento” teve o médico do trabalho e assessor de saúde do Sintrajufe/RS Geraldo Azevedo, a assessora técnica da Fenajufe e especialista em gestão pública Vera Miranda e a diretora de saúde e relações de trabalho do Sintrajufe/RS Mara Weber.
O médico Geraldo Azevedo apresentou Pesquisa de Saúde, Trabalho Remoto Compulsório e sob Confinamento com 426 participantes (entre out/2020 e mar/2021) que, entre outros pontos, indicou que:
- quantidade de trabalho aumentou para 43,5%;
- duração da jornada de trabalho aumentou para 40,5%;
- trabalho nos finais de semana = 35,5%;
- mesas, cadeiras, equipamentos de informática e conexão piores que no setor de trabalho (para 44-45%; exceto equipamentos, 29%);
- maior dificuldade de concentração para 37,1%;
- dificuldade de concentração em casa aumenta de acordo com o número de pessoas em casa;
- melhorou o número de pausas e a duração das pausas.
Dessa forma, diante dos dados levantandos, torna-se indispensável discutir com as administrações: o uso e limitações para o trabalho realizado por aplicativos; reposição de vagas; parametrização de metas para o trabalho remoto não superiores às do presencial; compensação para os gastos com energia/internet/equipamentos de informática e mobiliário; avaliação permanente das condições de trabalho.
“Há um limite para que o trabalhador seja produtivo”
A assessora técnica da Fenajufe Vera Miranda voltou ao debate e aprofundou alguns aspectos e consequências da hiperconexão atrelada ao debate do “tempo subjetivo”, ou o tempo necessário para refletir, descansar, abordado na fala da professora Magnólia. Nesse sentido, com as demandas diárias, ao fim do dia, o trabalhador está exaurido devido ao tempo de conexão.
Essa discussão, porém, traz a questão da necessidade de olhar com mais atenção para a jornada de seis horas como ponto fundamental em um trabalho com elaboração intelectual e, tendo, claro, as pausas necessárias. Vera ressaltou que há um limite para que o trabalhador seja produtivo: seja por exaustão física, seja por exaustão intelectual.
Esse tempo está ultrapassando os limites da produtividade: metas que passaram a não caber na jornada, inclusive com aumento de metas e redução de equipe. Ou ainda sobrecarregar em produtividade o que se quer reduzir em estrutura.
Vera frisou que é importante observar o tempo de conectar e desconectar – mesmo que essa desconexão venha carregada de uma sensação de estar “perdendo” algo ao não olhar o celular por alguns minutos. É na desconexão que você dá espaço para o ócio, que é indispensável para a saúde mental e fundamental para criatividade e inovação.
Precarização e aumento da violência no trabalho
A última convidada a falar no painel foi a diretora de saúde e relações de trabalho do Sintrajufe/RS Mara Weber, que destacou que falar sobre a saúde no trabalho significa entender o momento do capitalismo e do neoliberalismo que tem uma forma de organização que está no limite da barbárie – sem compromisso com a ética. Havia mediações do capital para a base que hoje o neoliberalismo implodiu: precarização e aumento da violência no trabalho.
Mara alertou para o perfil dos “multitarefas”, colocado principalmente nas mulheres que sofrem com a exaustão. Nesse cenário, houve aumento do assédio moral e sexual, da síndrome de burnout ou síndrome do esgotamento profissional, solidão, suicídio no trabalho.
Homenagens
Ao final dos debates, o ConSaúde homenageou o médico do trabalho Rogério Dornelles, da assessoria de saúde do Sintrajufe/RS, e a médica, pesquisadora e professora Margarida Maria Silveira Barreto – que tanto contribuíram com a luta das trabalhadoras e trabalhadores do PJU e MPU.
Os participantes do ConSaúde também reiteraram solidariedade à Oficiala de Justiça Beatriz Nubié Massariol, diretora do Sintrajud/SP e servidora do TRF-3, violentada em sua integridade ao ser demitida arbitrariamente por decisão da desembargadora Marisa Santos, presidenta do TRF-3. A Federação e o Sintrajud estão na luta em defesa da imediata anulação da demissão e a reintegração da servidora ao cargo.
Da Fenajufe