Por Paulo Roberto Koinski – coordenador do Sintrajusc
O plano do governo federal de reduzir vencimentos dos servidores em 25% e destinar tais valores ao sistema financeiro via transferência para pagamento aos “credores da dívida pública” é bem anterior à pandemia.
Neste sentido tramitam duas Propostas de Emenda Constitucional (PEC), uma na Câmara, que foi proposta em 2018, e outra no Senado, proposta em 2019, portanto bem anteriores à pandemia, que chegou ao Brasil em março de 2020, e agora a deputada governista Carla Zambelli ameaça propor mais uma PEC aproveitando este momento confuso.
A PEC 186/2019, chamada de emergencial, que tramita no Senado, torna mais rígidos os mecanismos de ajuste fiscal, para a União, caso as operações de crédito excedam a despesa de capital ou, para Estados e Municípios, as despesas correntes superem 95% das receitas correntes. Acontece que se esta PEC for aprovada hoje, ela já seria automaticamente imposta, pois as operações de crédito já excedem as despesas de capital.
Por ser prioritária para o governo, esta PEC não está parada e no dia 8 de abril de 2020 teve movimentação na Comissão de Constituição e Justiça do Senado.
Vários parlamentares, entre eles Carla Zambelli, Kim Kataguiri, Eduardo Bolsonaro e Roberto Jefferson, fizeram pronunciamentos cobrando do Parlamento que a questão da redução dos vencimentos dos servidores seja acelerada aproveitando o momento da pandemia.
O Partido Novo tentou incluir, por emenda à PEC do Orçamento de Guerra, a redução dos vencimentos dos servidores em até 50%.
No mês de abril, os presidentes da Câmara e do Senado tentaram emplacar a redução de vencimentos também aproveitando o álibi da pandemia, porém o presidente do STF, Dias Toffoli, resistiu à ideia e não aceitou.
O ministro Paulo Guedes, defensor da política de redução do estado e transferência de recursos para o sistema financeiro, não só cobra do Parlamento a redução dos vencimentos dos servidores como prepara o terreno atacando os servidores com termos chulos como “parasitas”, “inimigos”, “ladrões do dinheiro público” ou afirmando que “a geladeira dos servidores está cheia” e que “… colocamos a granada no bolso do inimigo”. E em suas falas ele usa dados falsos, como na de 7 de fevereiro deste ano, utilizando quatro dados falsos:
“O governo brasileiro está quebrado porque gasta 90% da sua receita com o funcionalismo público, classificado como ‘parasita’ pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, que considera urgente a aprovação da reforma administrativa ainda este ano, para que o dinheiro deixe de ser carimbado e chegue onde realmente faz falta”.
“O funcionalismo teve aumento de 50% acima da inflação, tem estabilidade de emprego, tem aposentadoria generosa, tem tudo. O hospedeiro está morrendo. O cara funcionário público virou um parasita e o dinheiro não está chegando no povo”.
O presidente da Câmara, Rodrigo Maia, em 10 de julho de 2019, na madrugada após a aprovação da Reforma da Previdência, foi ao púlpito da Câmara e fez um discurso de cinco minutos criticando os salários dos servidores e também divulgando dados falsos.
Hoje ele condiciona o pagamento de mais duas parcelas do auxilio emergencial à redução dos nossos vencimentos. Eles não fazem isso por acaso: o que está em jogo é 25% de uma rubrica de 200 bilhões anuais do orçamento, ou seja, 50 bilhões de reais que deixarão de ir para o orçamento familiar dos servidores públicos e irão direto do orçamento da União para o sistema financeiro representado pelo banqueiro ministro.
A PEC 186/2019 prevê:
1º – que sua aplicação será imediata:
“Art. 167-A. No exercício para o qual seja aprovado ou realizada, com base no inciso III do art. 167 da Constituição Federal, volume de operações de crédito que excedam à despesa de capital, serão automaticamente acionados mecanismos de estabilização e ajuste fiscal sendo vedadas ao Poder Executivo, aos órgãos do Poder Judiciário, aos órgãos do Poder Legislativo, ao Ministério Público da União, ao Conselho Nacional do Ministério Público e a Defensoria Pública da União, todos integrantes dos Orçamentos Fiscal e da Seguridade Social da União: …………………………..
2º – que se o resultado for positivo, os valores economizados irão para o sistema financeiro via amortização da dívida:
Art 3º, §1º,
II – destinação do excesso de arrecadação e do superávit financeiro das fontes de recursos, apurados nos orçamentos fiscal e da seguridade Social da União, com exceção do excesso de arrecadação e do superávit financeiro decorrentes de vinculação constitucional e de repartição de receitas com Estados, Distrito Federal e Municípios, à amortização da dívida pública federal.
A PEC 438/2018, chamada de PEC da regra de ouro, em tramitação na Câmara dos Deputados, também tem dispositivos semelhantes:
Art. 6º O Ato das Disposições Constitucionais Transitórias passa a vigorar acrescido dos seguintes arts. 36-B e 115:
Art 115, II,
- g) o saldo positivo de recursos vinculados, apurado nos orçamentos fiscal e da seguridade social da União, com exceção daquelas correspondentes à repartição de receitas com os demais entes da Federação e ao Fundo de Amparo ao Trabalhador – FAT, será destinado ao pagamento do serviço da Dívida Pública;
Concluindo, estas duas PECs, bem anteriores à pandemia, mostram que a redução dos vencimentos dos servidores civis é o objetivo deste governo e dos partidos alinhados com sua política econômica e que nelas está o eixo da reforma administrativa com a supressão de mais de uma dezena de direitos e destinação dos valores auferidos com tais medidas ao sistema financeiro credor de uma dívida publica não auditada.
A redução de 25% dos vencimentos com redução de 25% da jornada de trabalho é incompatível com a realidade da jornada hoje imposta pela tecnologia, cobrança de metas e redução de pessoal já em curso em todos os poderes, logo, os servidores continuarão com a mesma carga de trabalho.