O Ministério do Meio Ambiente perdeu mais uma batalha. A Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio), vinculada ao Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT), aprovou quinta-feira (17), a liberação do plantio e da comercialização do algodão Bollgard Evento 531, geneticamente modificado para oferecer resistência a insetos. A detentora da patente do algodão é a Monsanto do Brasil. A liberação foi aprovada durante uma reunião ordinária da CTNBio após seis meses de intenso debate sobre a questão com cientistas e técnicos do Ministério do Meio Ambiente. Ambientalistas advertiram que a planta transgênica pode contaminar espécies nativas de algodão, comprometendo a cadeia ecológica do Cerrado. O argumento foi derrotado.
O secretário-executivo da CTNBio, Jairon Nascimento, destacou que os membros da comissão aprovaram por ampla e absoluta maioria o parecer técnico que autoriza os produtores de algodão no Brasil a utilizarem a planta transgênica da Monsanto. Por outro lado, foram aprovadas algumas condições para a liberação. Entre elas está o fornecimento de informações moleculares para detecção do Bollgard Evento 531, a exclusão de algumas áreas para plantio, o estabelecimento de áreas de refúgio dentro das áreas de plantio e a adoção de práticas de manejo conservacionistas. A Monsanto também deverá fornecer um “plano de mitigação” para prevenir eventuais impactos na utilização desta tecnologia.
Em novembro de 2004, a CTNBio já havia autorizado a venda de lotes de sementes de algodão com até 1% de material geneticamente modificado. Naquela ocasião, a comissão havia constatado contaminação generalizada das sementes disponíveis, embora o algodão transgênico ainda estivesse proibido no Brasil, um processo semelhante ao que aconteceu com a soja no Rio Grande do Sul, onde os produtores começaram a plantar transgênicos utilizando sementes contrabandeadas da Argentina. O ato de liberação do algodão transgênico da Monsanto deve ser publicado no Diário Oficial da União nos próximos dias.
Comunicado da Monsanto
A Monsanto do Brasil divulgou um comunicado nesta sexta-feira (18), informando que aguardará a publicação da liberação no Diário Oficial da União para iniciar a comercialização do algodão transgênico no mercado nacional. O algodão Bt foi desenvolvido pela empresa com o objetivo de proteger as lavouras do ataques de insetos e pragas. Segundo a Monsanto, a nova variedade reduz os custos com agroquímicos e facilita o manejo da cultura. A planta teve inserido em seu código genético o gene da proteína de Bacillus thuringiensis, uma bactéria encontrada naturalmente no solo e utilizada como inseticida na agricultura orgânica.
Assim como ocorre em outros países, a Monsanto não comercializará diretamente o algodão Bt, valendo-se de empresas licenciadas que utilizarão a tecnologia em sementes de algodão adaptadas às diferentes regiões do país. Segundo dados do Serviço Internacional para a Aquisição de Aplicações em Agrobiotecnologia (ISAAA), em 2004, o algodão transgênico foi cultivado em cerca de 9 milhões de hectares de países como Estados Unidos, Austrália, Argentina, África do Sul, China e Índia. Agora, ele começará a ser plantado também no Brasil.
Cerrado está ameaçado, diz Greenpeace
O movimento ambientalista Greenpeace considerou “ilegal e irresponsável” a decisão da CTNBio, por liberar o plantio e a comercialização do algodão transgênico sem estudos prévios de efeitos sobre o meio ambiente. A medida, diz a organização, coloca em risco a biodiversidade do Cerrado. Segundo o Greenpeace, como o algodão é uma planta de polinização cruzada (o pólen pode fecundar outras plantas distantes) e a região do Cerrado é um centro de origem do algodão, as variedades selvagens podem ser contaminadas com o pólen de plantas transgênicas, provocando a destruição de espécies nativas. O engenheiro agrônomo Ventura Barbeiro, do Greenpeace, disse que “os atuais integrantes da CTNBio estão aproveitando os seus últimos dias de poder para liberar apressadamente todos os pedidos que beneficiam as grandes corporações de biotecnologia”. Segundo ele, a liberação do algodão transgênico antes da sanção presidencial à Lei de Biossegurança é um “ato ilegal e irresponsável”.
Ainda segundo Barbeiro, a variedade de algodão transgênico da Monsanto produz proteínas tóxicas e pode comprometer toda a cadeia ecológica do Cerrado. A flor do algodoeiro, observa, atrai muitas abelhas e vespas selvagens devido à grande quantidade de néctar e estes insetos podem desaparecer pelo efeito desta proteína tóxica. “No cerrado, 35% das plantas silvestres dependem de abelhas e vespas para a polinização. O desaparecimento desses agentes polinizadores pode causar a extinção de muitas plantas”, assegurou o engenheiro agrônomo, advertindo que o algodão transgênico inseticida é uma ameaça muito séria à biodiversidade da região onde ele é plantado.
Barbeiro lembrou, por fim, que a CTNBio sofrerá grandes modificações com a nova lei de biossegurança, passando de 18 para 27 integrantes. Essas mudanças ocasionarão um tempo maior para a composição da nova equipe, impedindo, assim, liberações comerciais de produtos transgênicos para a próxima safra. A Lei de Biossegurança aguarda uma decisão presidencial sobre o veto de dois artigos polêmicos que atribuem poder total à CTNBio sobre o tema da liberação de transgênicos e tornam facultativa a realização de estudos de impacto ambiental e sobre os efeitos dos transgênicos sobre a saúde humana e animal. A ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, está tentando convencer o presidente Luiz Inácio Lula da Silva a vetar os dois artigos, mas a comunidade ambientalista tem poucas esperanças sobre o seu êxito, considerando as recentes decisões do governo federal sobre o tema dos transgênicos.
Fonte: Agência Carta Maior