Jorge Luiz Souto Maior
No último dia 15 de abril, algumas organizações estudantis da Universidade de São Paulo, antes de se encaminharem para a manifestação no Largo da Batata, realizaram um ato público contra o PL 4.330/04 no rol de entrada da Faculdade de Direito (USP), tendo sido me concedida a oportunidade da fala. Na ocasião pedi para ficasse ali consignado um “registro histórico”, no sentido da advertência de que, depois da grande difusão dada na mídia de que teria havido um recuo do Congresso sobre o teor do PL 4.330/04, levando, inclusive, os movimentos sociais e sindicais a considerarem que já tinham obtido uma grande vitória com a aprovação da Emenda supressiva, encaminhada pelo PSDB, com apoio do PT, que retirou a menção da aplicação do PL “às empresas públicas, às sociedades de economia mistas e suas subsidiárias e controladas, no âmbito da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios” e da retirada da pauta, pelo PR, da Emenda 72, que visava explicitar a aplicação do PL à administração pública direta, deveríamos ficar muito atentos, pois aquela situação dava a entender que algo estava sendo gestado no âmbito da terceirização no setor público.
O destaque à notícia da aprovação da Emenda supressiva parecia-me uma estratégia para retirar a discussão da terceirização no setor público do âmbito do calor das manifestações contrárias ao PL, o que permitiria uma facilidade maior para passar o PL, ao mesmo tempo em que conduzia, sem alarde, a questão da terceirização no setor público para outra esfera de regulação.
O anúncio midiático conferia, também, o argumento para que se dissesse que negociações foram feitas sobre o conteúdo do PL e que com mais um ou outro “ajuste”, como, por exemplo, a fixação da responsabilidade solidária do tomador de serviços no que tange a certos direitos dos terceirizados (talvez, “verbas rescisórias”, em condições inaplicáveis, de todo modo), se chegaria a um grande acordo no qual o segmento empresarial veria atingido o seu objetivo e os políticos preservados os seus interesses eleitorais, dizendo que ouviram a voz das ruas, e que todos nós, que estávamos ali saindo para a manifestação poderíamos estar sendo feitos de “massa de manobra” para esse ajuste, que teria como efeito gravíssimo a aprovação menos ampla do PL, mas que, no fundo, legitimaria a terceirização e todas as suas perversidades que estão aí há décadas solapando a vida de milhões de trabalhadoras e trabalhadores terceirizados, sem enfrentar, ainda, o problema concreto da terceirização no setor público.
Em texto publicado em janeiro deste ano, tentei chamar atenção para o fato de que o plano estratégico de atuação imposto ao Judiciário, em conformidade com as diretrizes do Banco Mundial, seguindo o padrão teórico consignado no conhecido Documento n. 319, elaborado na década de 90, teria o objetivo de moldar os juízes para reproduzirem a (ir)racionalidade de mercado e assim fazer com que as reformas neoliberais, de retirada de direitos, não se submetessem ao calor das resistências populares, advindo, isto sim, da própria atuação jurisdicional, sendo que o maior condutor dessa “obra”, já que a Justiça do Trabalho, institucionalmente, se “recusou” a fazê-lo, submetida que está aos princípios do Direito do Trabalho, que muitos teóricos, durante muito tempo, tentaram destruir mas não conseguiram, poderia ser o Supremo Tribunal Federal nos julgamentos das ADIs e na utilização do mecanismo da repercussão geral, ainda mais depois que, estrategicamente, fizeram-se ataques públicos ao Supremo, acusando-o de estar se curvando ao “bolivarianismo”.
No texto, fazia menção à derrota experimentada pela classe trabalhadora no julgamento, havido em 13/11/14, tratando da prescrição do FGTS, no recurso de um processo (ARE 709212), ao qual se deu, sem qualquer explicação razoável, repercussão geral. Destacava o risco que os trabalhadores corriam em julgamentos futuros, sobretudo por conta dos argumentos utilizados naquele julgamento, que incorporaram os argumentos abstratos e retóricos da (ir)racionalidade econômica, conforme expresso no voto do Ministro Fux: “Novos tempos, novos direitos”.
Pois não é que naquele mesmo dia, do evento na Faculdade e da manifestação popular contra o PL 4.330/04, dia 15 de abril de 2015, estava sendo julgada no Supremo Tribunal Federal a ADI 1923, que trata exatamente da possibilidade de transpasse pelo Administrador de serviços públicos ao setor privado…
A ação, proposta em 1º./12/98, estava paralisada desde 21/10/13, quando o Ministro Marco Aurélio pediu vista. Com a devolução, em 10/02/15, o processo foi posto imediatamente em pauta e julgado, sem alarde, no dia 15/04/15, impedindo, assim, qualquer tipo de manifestação pública a respeito, ainda mais porque o voto condutor do Acórdão, proferido pelo Min. Fux, no sentido da constitucionalidade da lei que autoriza os convênios com as Organizações Sociais, conforme abaixo explicado, já era conhecido, vez que proferido em 19/05/11.
Oportuno o registro de que as partes do processo, que certamente tiveram ciência prévia de que o feito estava em pauta para julgamento, eram, dentre outras, o PT, o PDT, a Presidência da República e o Congresso Nacional, que, portanto, não demonstraram possuir o menor interesse em divulgar o advento do julgamento. Isso reforça a suposição de que de fato havia – e ainda há – um grande ajuste de interesses para a ampliação da terceirização no setor público, que se pretende seja implementado sem qualquer debate com a opinião pública a respeito.
Aliás, do ponto de vista da posição do Supremo frente aos interesses da classe trabalhadora, é interessante notar que o julgamento da ADI 1625, que trata da inconstitucionalidade da denúncia, feita pelo então Presidente da República, Fernando Henrique Cardoso, da Convenção 158, da OIT, que inibe a dispensa arbitrária de empregados, notadamente as dispensas coletivas, proposta em proposta em 19/06/97, até hoje não foi concluído, embora já tenha votos expressos pela inconstitucionalidade. Ou seja, não se verificou a mesma eficiência que se viu na ADI 1923 para julgar a ADI 1625, ainda mais porque, no mérito, é bastante difícil afastar a inconstitucionalidade da denúncia. De todo modo, há que se estar bastante atento, pois segundo informação constante do site do SFT, o processo da ADI 1626 foi devolvido a julgamento, em 10/04/15.
Fato é que as pessoas e entidades em geral, que estão nas ruas lutando contra a terceirização, ainda não se deram conta do tamanho do estrago provocado pela decisão da ADI 1923.
Resumidamente, conferindo uma interpretação conforme a Constituição da Lei n. 9.637/98, seguindo a redação que lhe fora dada pela Lei n. 9.648/98, ambas editadas no governo FHC, para implementação da ideia neoliberal de Estado mínimo, incorporada na compreensão econômica de Bresser-Pereira (desde a criação do MARE, em 1995), o que o Supremo disse, agora, em 2015, é que a atuação do Estado na saúde, na educação, na cultura, no desporto e lazer, na ciência e tecnologia e no meio ambiente pode se realizar mediante uma gestão compartilhada com o setor privado, por intermédio da formalização de “instrumentos de colaboração público/privada”, pelos quais se reserva a participação do Estado como entidade de “fomento”, não apenas com transferência de recursos financeiros, mas também pela cessão de bens públicos e até de servidores públicos, sendo que esses instrumentos, que são, de fato e de direito, convênios, serão feitos com ONGs, alçadas ao “status” (“título jurídico”) de Organização Social por meio de deliberação do próprio ente público.
Nesse aspecto, aliás, a preocupação do voto vencedor no Supremo foi muito mais com o interesse das ONGs do que com o interesse público, ao explicitar que: “É de se ter por vedada, assim, qualquer forma de arbitrariedade, de modo que o indeferimento do requerimento de qualificação, além de pautado pela publicidade, transparência e motivação, deve observar critérios objetivos fixados em ato regulamentar expedido em obediência ao art. 20 da Lei nº 9.637/98, concretizando de forma homogênea as diretrizes contidas nos inc. I a III do dispositivo.”
Ora, trata-se de critério objetivo para impedir a arbitrariedade na entrega do “título”, enquanto que o problema concreto, na órbita do interesse público, não é este e sim o da escolha da administração para formalizar o convênio, sendo que neste aspecto o julgamento estabeleceu que NÃO HÁ LICITAÇÃO para a contratação, admitindo, pois, a respeito, a atuação discriminatória do administrador, ainda que sob a retórica de que a contratação deva obedecer a “um procedimento público impessoal e pautado por critérios objetivos, por força da incidência direta dos princípios constitucionais da impessoalidade, da publicidade e da eficiência na Administração Pública (CF, art. 37, caput)”.
A decisão do Supremo, reproduzindo o espírito da lei em julgamento, prevê, ainda, a possibilidade de que as OSs formalizem, elas próprias, contratos com terceiros para a execução dos serviços, sem licitação, e, pior, que possa contratar trabalhadores sem concurso público, negando-lhe, por conseqüência, as garantias jurídicas dos estatutários. Prevê, ainda, que servidores estatutários prestem serviços às OSs e recebam destas uma remuneração fora dos padrões da “legalidade”.
Importantíssimo, ademais, destacar alguns dos argumentos utilizados no voto vencedor, do Min. Fux, que dão bem o tom neoliberal da decisão: “A atuação da Corte Constitucional não pode traduzir forma de engessamento e de cristalização de um determinado modelo pré-concebido de Estado, impedindo que, nos limites constitucionalmente assegurados, as maiorias políticas prevalecentes no jogo democrático pluralista possam pôr em prática seus projetos de governo, moldando o perfil e o instrumental do poder público conforme a vontade coletiva”.
O resultado dessa (ir)racionalidade neoliberal foi fazer letra morta da Constituição, pois quando a Constituição preconiza que os serviços na saúde (CF, art. 199, caput), na educação (CF, art. 209, caput), na cultura (CF, art. 215), no desporto e lazer (CF, art. 217), na ciência e tecnologia (CF, art. 218) e no meio ambiente (CF, art. 225) são serviços públicos e que “são deveres do Estado e da Sociedade”, estando “livres à iniciativa privada”, o que pretendeu foi deixar claro que as entidades privadas que se ativarem nesses setores não poderão visar apenas o lucro, estando obrigadas a respeitarem as finalidades próprias da prestação de um serviço público, buscando, em primeiro plano, a satisfação dos interesses da sociedade, cumprindo ao Estado, isto sim, a obrigação de impedir a mera mercantilização desses serviços ao mesmo tempo em que lhe compete programar e efetivar políticas públicas para a execução desses serviços e não simplesmente transferir sua responsabilidade para o setor privado, entregando a este dinheiro e bens públicos, ainda mais sem licitação, de modo, inclusive, a afastar a garantia constitucional do acesso democrático ao serviço público pela via do concurso, tudo em nome de uma suposta eficiência, que estaria garantida pelo controle do resultado, conforme, aliás, está sugerido no voto vencedor: “A finalidade de fomento, in casu, é posta em prática pela cessão de recursos, bens e pessoal da Administração Pública para as entidades privadas, após a celebração de contrato de gestão, o que viabilizará o direcionamento, pelo Poder Público, da atuação do particular em consonância com o interesse público, através da inserção de metas e de resultados a serem alcançados, sem que isso configure qualquer forma de renúncia aos deveres constitucionais de atuação.”
Ora, como bem destacou o Min. Marco Aurélio, em seu voto que restou vencido (acompanhado que foi apenas pela Min. Rosa Weber):
A modelagem estabelecida pelo Texto Constitucional para a execução de serviços públicos sociais, como saúde, ensino, pesquisa, cultura e preservação do meio ambiente, não prescinde de atuação direta do Estado, de maneira que são incompatíveis com a Carta da República leis e programas de governo que emprestem ao Estado papel meramente indutor nessas áreas, consideradas de grande relevância social pelo constituinte.
A extinção sistemática de órgãos e entidades públicos que prestam serviços públicos de realce social, com a absorção da respectiva estrutura pela iniciativa privada – característica central do chamado “Programa Nacional de Publicização”, de acordo com o artigo 20 da Lei nº 9.637/98 –, configura privatização que ultrapassa as fronteiras permitidas pela Carta de 1988.
O Estado não pode simplesmente se eximir da execução direta de atividades relacionadas à saúde, educação, pesquisa, cultura, proteção e defesa do meio ambiente por meio da celebração de “parcerias” com o setor privado.
Além disso, mesmo que não houvesse uma grave inversão axiológica das normas constitucionais, não se pode, razoavelmente, prever uma melhoria da prestação desses serviços com a sua “privatização”, vez que nesse modo de execução tendem a ser mercantilizados e submetidos a lógicas meramente econômicas, voltadas ao lucro, sem falar, é claro, da maior facilitação de desvios indevidos do erário e da maior promiscuidade de interesses entre o público e o privado inclusive com objetivos eleitorais, cumprindo lembrar que o permissivo dos convênios vale para todos os municípios e estados do país, bem como para o governo federal, evidentemente.
Conforme observa com bastante propriedade Gustavo Alexandre Magalhães:
“…após alguns anos de experiência no desenvolvimento do terceiro setor, a opinião pública observa a transferência de quantias vultosas para entidades não governamentais ligadas a partidos políticos e pessoas com grande influência junto às autoridades públicas, ou mesmo para desviar dinheiro público em benefício de interesses exclusivamente privados”.
A lógica privatista do Estado, que permite uma enorme promiscuidade com o setor privado, no entanto, foi acatada pelo Supremo, segundo explicitado no voto: “Na essência, preside a execução deste programa de ação institucional a lógica, que prevaleceu no jogo democrático, de que a atuação privada pode ser mais eficiente do que a pública em determinados domínios, dada a agilidade e a flexibilidade que marcam o regime de direito privado. – grifou-se.
Aliás, na ânsia de afirmar a (ir)racionalidade neoliberal, o voto do relator extrapola todos os limites jurídicos e simplesmente desconsidera a existência do aparado jurídico trabalhista, legal, constitucional e historicamente concebido, para sugerir, sem qualquer base teórica e com certa dose de irresponsabilidade, que “Os empregados das Organizações Sociais não são servidores públicos, mas sim empregados privados, por isso que sua remuneração não deve ter base em lei (CF, art. 37, X), mas nos contratos de trabalho firmados consensualmente”.
Ora, nas relações de emprego, mesmo privadas, a base remuneratória é legal e constitucionalmente fixada e não consensualmente estabelecida, a não ser no aspecto da superação, favorável ao trabalhador, do parâmetro legal.
Em suma, mesmo tentando conferir um verniz de respeito ao interesse público, mediante a permissão de “percentual de representantes do poder público no Conselho de Administração das organizações sociais” e a previsão de que: “(i) o procedimento de qualificação seja conduzido de forma pública, objetiva e impessoal, com observância dos princípios do caput do art. 37 da CF, e de acordo com parâmetros fixados em abstrato segundo o que prega o art. 20 da Lei nº 9.637/98; (ii) a celebração do contrato de gestão seja conduzida de forma pública, objetiva e impessoal, com observância dos princípios do caput do art. 37 da CF; (iii) as hipóteses de dispensa de licitação para contratações (Lei nº 8.666/93, art. 24, XXIV) e outorga de permissão de uso de bem público (Lei nº 9.637/98, art. 12, §3º) sejam conduzidas de forma pública, objetiva e impessoal, com observância dos princípios do caput do art. 37 da CF; (iv) os contratos a serem celebrados pela Organização Social com terceiros, com recursos públicos, sejam conduzidos de forma pública, objetiva e impessoal, com observância dos princípios do caput do art. 37 da CF, e nos termos do regulamento próprio a ser editado por cada entidade; (v) a seleção de pessoal pelas Organizações Sociais seja conduzida de forma pública, objetiva e impessoal, com observância dos princípios do caput do art. 37 da CF, e nos termos do regulamento próprio a ser editado por cada entidade; e (vi) para afastar qualquer interpretação que restrinja o controle, pelo Ministério Público e pelo TCU, da aplicação de verbas públicas”, o que resulta, em concreto, do julgamento é que os governos poderão conferir um título jurídico de Organização Social a quem atenda, por meio de requisitos fixados em regimentos internos, e poderá, também, firmar convênios com a Organização Social que quiserem, transferindo-lhes dinheiro e bens públicos, além de servidores públicos, para administrarem serviços públicos em diversas áreas, sendo que essas organizações, ainda que controladas pelo Ministério Público e pelo Tribunal de Contas, farão suas gestões sob a esfera da ordem jurídica de direito privado, inclusive e principalmente, no que se refere à contratação de trabalhadores, atingindo a execução de serviços que se integram ao conceito de atividade-fim do serviço público, com relação aos quais a mera terceirização (direta) não pode atingir.
Pelo artifício jurídico legitimado pela decisão do Supremo permitiu-se, enfim, a terceirização da atividade-fim no setor público, mediante a “terceirização” da própria administração, indo bem além (e sem limites) das hipóteses já previstas no art. 175 da Constituição (concessão e permissão de serviços públicos). Assim, um ente público poderá, por exemplo, transferir para uma OS, na forma acima narrada, uma atividade escolar ou de saúde. A organização Social responsável, recebendo dinheiro público e bens públicos, poderá prestar esses serviços por intermédio de professores e médicos contratados sem concurso público, sendo que a estes não se garantirá, por consequência, a estabilidade no emprego, que é atinente aos servidores, dentre outros direitos específicos.
Cumpre verificar que se estamos falando de serviços públicos, prestados no contexto da administração pública, ainda que por meio das OSs, estes não poderão ser cobrados da população e, por conseqüência, o lucro das organizações sociais – e o benefício dos governos – só se concretizará com a precarização das condições de trabalho desses profissionais, estando a reação coletiva destes extremamente dificultada pela perda da representação sindical e mais ainda se, em complemento, vier a ser aprovada a PL 4.330/04, vez que isto permitiria às OSs terceirizarem os serviços, valendo a observação de que se tudo isso deteriora a condição de trabalho dos professores e médicos, interferindo na própria liberdade didática ou clínica, que dirá, então, dos trabalhadores na limpeza e vigilância.
A sensação que fica é que todos que lutam contra a terceirização foram induzidos a um grande erro, envolvidos em um “jogo de cena” de muitos atores que serviu, propositalmente, para impedir a formulação de uma compreensão e, consequentemente, à organização de uma resistência popular a respeito dos propósitos privatizantes e precarizantes inseridos no objeto do julgamento da ADI 1923.
A luta contra o PL 4.330/04 precisa continuar, por certo, mas há de se reconhecer que a desarticulação e um envolvimento mais consistente contra a terceirização em si, em todos os níveis, já deixaram essa grande baixa, que foi o julgamento da ADI 1923. Para que se vislumbre uma reversão da situação ou se evitem danos maiores, é preciso que essa questão seja inserida nas reações de todas as pessoas e entidades que se ponham em defesa da ordem constitucional e dos direitos sociais. Sobretudo precisam tomar ciência da situação aqueles que serão diretamente atingidos por ela, quais sejam, os servidores públicos e os consumidores desses serviços.
Um dos grandes problemas da terceirização, que é o da sua inserção na administração pública, que afronta a Constituição e que favorece à corrupção e ao desvio de verba pública, sem perder, por certo, a sua característica básica que é a precarização, está correndo, de forma livre, ao largo das mobilizações, legitimando-se e até ampliando-se.
Certo que se esses dispositivos de lei foram declarados constitucionais, também podem ser revogados por lei posterior. É certo também que essa lei específica, para ter vida concreta, precisa da efetivação de convênios e estes podem vir a existir, ou não. Mas, em concreto, é essencial que este tema seja inserido, com urgência, na pauta de discussões em torno do PL 4.330/04, para que se tenha um alcance real da problemática que envolve a terceirização e para que se possa implementar uma resistência consistente à precarização do trabalho e à destruição plena do projeto constitucional de Estado Social.
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Jorge Luiz Souto Maior é juiz do trabalho e professor livre-docente da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP). Autor de Relação de emprego e direito do trabalho (2007) e O direito do trabalho como instrumento de justiça social (2000), pela LTr.