Por Janice Miranda
O Pará é o Estado brasileiro onde existem mais ocorrências de trabalho escravo, mas está em campanha para erradicar o mal, com propaganda no rádio e TV, out-doors, folhetos, camisetas, cartilha e sobretudo fiscalização redobrada. No ano passado, depois que a Delegacia Regional do Trabalho criou o Grupo de Combate ao Trabalho Escravo, foram resgatados no Pará mais de 2 mil trabalhadores em regime de escravidão, correspondendo à maioria absoluta dos resgates feitos em todo o Brasil.
Unaí/Pará, a conexão escravocrata
Ocorre que o Pará é também o recordista em escravização de trabalhadores. Pode existir inclusive uma conexão paraense do Massacre de Unaí, em que fiscais do Trabalho foram assassinados na semana passada no noroeste de Minas Gerais. Muitos fazendeiros da região também têm terras no Pará; o prefeito de Unaí, José Braz da Silva (PTB), é dono de terras no Pará e possui uma condenação por uso de trabalhadores em condição análoga à escravidão.
Segundo a CPT (Comissão Pastoral da Terra), única instituição que tenta acompanhar o fenômeno com levantamentos estatísticos, os casos de trabalho escravo no Brasil podem somar 30 mil. E 54,4% deles se concentram no Pará. Os estabelecimentos que mais escravizam trabalhadores são fazendas de gado (49%), seguidos por madeireiras (26%).
“O Pará é o palco principal do trabalho escravo”, descreve Socorro Gomes, Delegada Regional do Trabalho, indicada pelo Ministério do Trabalho no governo Lula, e iniciadora da campanha pela erradicação desta prática. Ela explica que a imensa maioria das vítimas do trabalho escravo são recrutadas em outros Estados — principalmente Piauí, Maranhão, Tocantins e Ceará —, até porque o fato de o trabalhador ser um forasteiro, sem vínculos locais, facilita o cativeiro. Os modernos senhores de escravos na grande maioria também são de fora, mais freqüentemente de São Paulo, Goiás, Minas Gerais e do Sul do país, havendo também alguns do Nordeste. Mas é no Pará, em especial nas áreas da fronteira agrícola, que a prática é mais disseminada.
Uma câmara coordena a campanha
Socorro Gomes criou o Grupo de Combate ao Trabalho Escravo em abril passado, logo depois de assumir a DRT/PA. Em seguida, montou também uma câmara para coordenar a campanha, aglutinando 27 instituições, desde órgãos públicos, dos três Poderes, até entidades da sociedade civil como a CPT, a Fetagri (Federação dos Trabalhadores na Agricultura) e a seção estadual da Ordem dos Advogados. A presente ofensiva pela erradicação é fruto desta soma de esforços.
E o dinheiro para a campanha? Uma inserção na TV não é barata… Socorro ri. “Fomos atrás de parceria. Não é assim que se diz agora?”, explica, assegurando que a reação foi boa e “a grande maioria está ajudando”.
A delegada do Trabalho registra que “a maioria dos fazendeiros do Pará não usa trabalho escravo”, mas, agrega, “a minoria que usa é criminosa, não tem escrúpulos”. Ela diz, porém, que não sofreu ameaças depois do início da presente ofensiva.
Antes da criação do Grupo de Combate da DRT, quem atuava no combate à escravidão no Pará era o Grupo Móvel do Ministério do Trabalho, criado em 1995. Depois do Massacre de Unaí, os auditores pediram que as fiscalizações só prosseguissem com cobertura da Polícia Federal. Socorro Gomes retrucou que isso inviabilizaria o trabalho, pois a PF tem efetivos reduzidos, e que era preciso prosseguir, “por dever cívico”. Ela esclarece, contudo, que só é assim nas investigações de rotina, pois quando há suspeita de trabalho escravo a PF sempre acompanha. “Quem é capaz de reduzir alguém a escravo é capaz de tudo”, argumenta.
Fonte: Diário Vermelho com informações da DRT/PA