Por Marcela Cornelli
Leia abaixo matéria da Agência Carta Maior
O governo Lula não irá reservar recursos suficientes para a execução do Plano Nacional de Reforma Agrária anunciado pelo Ministro do Desenvolvimento Agrário, Miguel Rossetto, na última quinzena de novembro. Ontem, em reunião com os movimentos sociais camponeses, Rossetto avisou que o governo não apresentará emendas ao orçamento de 2004 e ao Plano Plurianual (PPA). Ou seja, no planejamento dos gastos governamentais para o ano que vem, continuarão a constar para a reforma agrária R$ 630 milhões, número 75% inferior ao necessário (R$ 2,54 bilhões) para a execução da meta de 115 mil assentamentos anunciada pelo governo.
O PPA enviado ao Congresso, que estabelece as metas de investimento para os próximos quatro anos, prevê o assentamento de apenas 118 mil famílias. Número extremamente inferior ao estabelecido pelo PNRA do ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), que promete assentar outras 115 mil famílias em 2005, 140 mil em 2006 e 150 mil em 2007.
O Fórum Nacional de Reforma Agrária (FNRA), entidade que congrega cerca de 40 movimentos camponeses e é responsável pela condução das negociações com o MDA, mostrou-se perplexo com a postura do ministro. “Agora estamos que nem São Tomé: só acreditamos vendo”, brinca Gilberto Portes, secretário executivo do Fórum.
“O que está acordado com o Ministério da Fazenda, do Planejamento e com a Presidência é que nós não apresentaremos emendas ao orçamento e eles irão utilizar todos os mecanismos que têm para obter créditos especiais e suplementação ao orçamento”, pontua o secretário executivo do MDA, Guilherme Cassel, por meio de sua assessoria de imprensa. “Inclusive, se a arrecadação no ano que vem for maior, como está previsto, ficará mais fácil de obter essa suplementação”, pondera o secretário.
Portes reconhece a existência de outros mecanismos institucionais para a obtenção de recursos. Afirma, porém, que os movimentos continuam a reivindicar alterações no orçamento. “Sem isso, nós ficamos com um pé atrás. Não iremos julgar antes que as coisas aconteçam, mas estamos inseguros”.
Na conversa com os movimentos sociais, da qual participaram cerca de dez lideranças camponesas, entre elas João Paulo Rodrigues, da coordenação nacional do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), Dom Tomás Balduíno, da Comissão Pastoral da Terra e Francisco Miguel de Lucena, secretário de organização e formação sindical da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Agricultura (Contag), Rossetto não esclareceu as razões que levaram o governo a manter o orçamento e PPA como estão. “Ele simplesmente alegou que era uma decisão do núcleo do governo”, informa Portes. Para um dos participantes da reunião, porém, o governo não quis introduzir na pauta do Congresso um tema polêmico como a reforma agrária, ainda mais na fase final de aprovação das reformas da Previdência e tributária.
Pressão popular
A reunião entre Rossetto e o Fórum não serviu apenas para tratar dos recursos para a reforma agrária. Os movimentos também pediram ao ministro um detalhamento do plano nacional anunciado no mês passado e cobraram medidas de reestruturação do Incra. Segundo Portes, o detalhamento ponto por ponto do PNRA ficou para a primeira quinzena de janeiro. Mais especificamente para o dia 12, quando ocorre nova reunião do governo com os movimentos. Nessa data, será esclarecido o conceito do plano, a sistemática de desapropriações e serão delineados os processo de reformulação da legislação. “Ele ainda garantiu que nós participaremos de todas as decisões”, rememora o secretário do Fórum. Rossetto ainda anunciou que o MDA irá apresentar balanços públicos mensais de prestação de contas sobre o processo de execução da reforma agrária.
Segundo Portes, essa parceria entre o governo e os movimentos não significa que os métodos de pressão popular serão abandonados. Pelo contrário. A partir de janeiro, o Fórum lançará uma campanha nacional pela reforma agrária. A reunião em que as características da campanha serão decididas ocorre no dia 15 de janeiro. Portes adianta, apenas, que os movimentos terão como bandeira de luta o plano de reforma agrária elaborado pelo economista e ex-deputado federal Plínio de Arruda Sampaio, que, entre outros pontos, sugere o assentamento de 1 milhão de famílias em quatro anos.
“A questão política está colocada. As metas anunciadas pelo governo só serão realizadas se houver muita pressão social. Se nós não tivéssemos feito marcha, conferência, acampamento, não tinha saído plano de reforma agrária”, avalia o secretário do Fórum. “Não podemos depender só da boa vontade do ministro”, diz.
Fonte: Agência Carta Maior