Ameaçado de morte pelo Talebã por se recusar a pagar propinas ao grupo, Mahmoud (nome fictício) achou por bem abandonar sua cidade, na fronteira entre o Afeganistão e o Paquistão. Pagou US$ 5 mil a uma gangue de tráfico humano, que prometeu lhe enviar a um país do outro lado do mundo do qual sabia muito pouco, mas onde, segundo o grupo, poderia solicitar refúgio e reiniciar sua vida em paz: o Brasil.
Certo dia, como um colega se adoentou, Mahmoud foi escalado para trabalhar por dois turnos seguidos. Ao se queixar ao supervisor, foi insultado e demitido. No dia seguinte, outro estrangeiro já ocupara seu lugar. Sem um tostão, hoje aguarda pela definição do seu pedido de refúgio ao Conare (Comitê Nacional para os Refugiados, órgão vinculado ao Ministério da Justiça), faz as refeições em centros religiosos e procura outro emprego. “Disseram que no Brasil eu encontraria paz, mas virei um escravo e, hoje, vivo como um mendigo.”
Todos os trabalhadores são muçulmanos, já que o abate halal requer que os animais tenham suas gargantas cortadas manualmente por seguidores do islã. Eles devem pronunciar a frase “Em nome de Deus, Deus é maior!” (Bismillah Allahu Akbar, em árabe) antes de cada degola. O gesto deve cortar a traqueia, esôfago, artérias e a veia jugular, para apressar o sangramento e poupar o animal de maior sofrimento.
Condições análogas à escravidão
Ballarini conta que os trabalhadores, que costumam chegar ao Brasil com vistos de turista, são geralmente arregimentados para o serviço em mesquitas. “Mesmo sabendo que a situação é precária, eles têm medo de denunciar e serem deportados.” Já a CDIAL Halal afirmou em nota que todos os seus funcionários encontram-se em situação legal no País e procuram a empresa por livre vontade. A companhia diz que o abate se dá conforme normas adequadas de segurança, que todos os funcionários têm carteira assinada e executam jornada de até oito horas (intercaladas entre uma hora trabalhada e uma de descanso), registrada por relógio de ponto biométrico.
Segundo o procurador Ballarini, os casos de Samambaia e das fábricas paranaenses indicam que pode haver uma rede nacional de exploração de trabalho no abate halal. A BBC Brasil apurou que o tema também é objeto de uma investigação do MPT em Campinas (SP). O Ministério do Trabalho, por sua vez, afirmou que apurará as denúncias de abusos em Samambaia e que prepara uma nova regulamentação para o trabalho em frigoríficos.
Além de condenar as condições de trabalho no abate halal, Ballarini considera ilegal a terceirização da atividade, efetuada pela BR Foods em todas as suas fábricas que exportam para países islâmicos. Ele argumenta que uma companhia só pode terceirizar uma de suas atividades-meio (no caso da Sadia, o abate de animais) se não houver subordinação entre os terceirizados e a empresa principal.
A empresa afirma, no entanto, que os funcionários terceirizados cumprem uma jornada de trabalho equivalente à dos trabalhadores da empresa e estão sujeitos às mesmas condições que os outros funcionários da unidade. A BR Foods não se pronunciou sobre as condições dos dormitórios dos funcionários terceirizados. CDIAL Halal, por sua vez, afirmou que “não tem qualquer obrigação de tutelar o domicílio de seus empregados, tampouco seus hábitos de higiene pessoal”.
A Justiça do Trabalhou determinou nesta quarta-feira,18, o bloqueio R$ 4.710.000,00 (quatro milhões, setecentos e dez mil reais) da conta bancária da Empresa BR Foods (Sadia S.A. e Perdigão). Os valores já estão à disposição da Justiça do Trabalho em razão de convênio que permite aos Juízes do Trabalho bloquear de forma on-line as contas das empresas.
Entenda o caso:
A Empresa:
Processo: ACP 01327-2009-012-12-00-0 e CS 01327-2009-012-12-01-2Fonte: http://trt-12.jusbrasil.com.br/noticias/2994442/justica-do-trabalho-bloqueia-r-4-7-milhoes-da-br-foods