Por: Mauro Santayana*
Segundo os estudiosos, o Estado é a conseqüência direta das formas simbólicas, criadas pelos primeiros homens, a fim de substituir o instinto da hostilidade pela convivência pacífica. O primeiro objetivo do Estado foi defender os pobres contra os ricos, os fracos contra os fortes. A polícia, parte do Estado, devia servir para proteger as pessoas contra os violentos e contra os ladrões – os comuns e os de colarinho branco. O Estado existe para que os pobres participem não só da construção, mas também, como é de seu direito, do gozo dos benefícios da civilização.
Entretanto, o Estado que conhecemos, e Marx já denunciara, tem servido para proteger o poder dos ricos sobre a nação – e contra os pobres. Isso ficou pior nos últimos 30 anos, com o lema de “Estado mínimo”, do neoliberalismo, que exige, principalmente nos países em desenvolvimento, a liberdade de cobrar juros de agiota; de produzir e de comprar e vender sem obedecer regras; de especular na bolsa; de planejar crises econômicas, com seus capitais “pirata”; de desnacionalizar bancos e empresas privadas e estatais; de controlar os preços internacionais dos produtos exportados; e de impedir seu acesso à ciência e tecnologia.
Assim reduzem a tarefa do Estado à manutenção dos privilégios do capital contra o direito à vida dos trabalhadores. Como a maioria das pessoas não tem outra coisa que vender senão a força de seus braços, a “liberdade de mercado” só interessa aos patrões. E se os explorados protestarem, ou entrarem em greve, a polícia do Estado é chamada a manter a ordem.
Na segunda metade do século 19, a Inglaterra era o país mais industrializado do mundo. As crianças e as mulheres eram obrigadas a trabalhar como homens no fundo das minas de carvão e nas fábricas, de 12 a 16 horas por dia, sete dias por semana. Recebiam apenas para comer – e mal. Era tão forte a exploração que os trabalhadores, desnutridos, passaram a diminuir de tamanho. O Exército da Inglaterra foi obrigado a reduzir de 1,60 metro para 1,52 a estatura dos recrutas, porque os ingleses pobres estavam ficando anões.
A criação do Partido Trabalhista da Inglaterra, o Labour Party, para as eleições de 1906, possibilitou que fossem votadas leis que aliviaram a situação da classe operária e permitiram à Grã-Bretanha enfrentar as tropas alemãs na Primeira Guerra Mundial (1914-1918). Outro fator favorável, e mais importante, foi a Revolução Soviética, de 1917. O medo de que os trabalhadores do mundo inteiro acompanhassem o movimento socialista levou os países capitalistas a adotar a jornada de oito horas, o fim do trabalho aos domingos e, em alguns, o sistema de férias e a previdência oficial. No Brasil, a partir de Vargas os trabalhadores contavam com estabilidade, salário mínimo profissional, férias anuais, descanso semanal remunerado e sistema de aposentadoria.
Em 1989, ao cair o Muro de Berlim, economistas do FMI, do Banco Mundial e do Departamento de Tesouro dos EUA se reuniram em Washington e redigiram um programa “de reestruturação” para os países em desenvolvimento, o chamado Consenso de Washington, que resultou na privatização das grandes empresas estatais e na desregulamentação das relações de trabalho.
Agora, com a nova crise do capitalismo, os mesmos neoliberais que determinaram o fim do Estado como regulador das atividades econômicas batem às portas do Tesouro norte-americano para salvar os bancos quebrados. Resumo da história: quando o mercado está favorável, os banqueiros especulam e ganham bilhões; quando, em conseqüência de suas fraudes e irresponsabilidades, se tornam insolventes, correm para o Estado. Foi assim com o Proer, no governo Fernando Henrique, e está sendo assim nos EUA hoje.
Mas os trabalhadores estão sempre no prejuízo. Ainda agora, tramita e prospera, no Congresso, novo projeto de reforma das leis do trabalho. Entre outras propostas, há a de acabar com o décimo terceiro salário. Fonte: DIAP
(*) Mauro Santayana trabalhou nos principais jornais brasileiros a partir de 1954. Foi colaborador de Tancredo Neves e adido cultural do Brasil em Roma nos anos 1980. Artigo publicado na Revista do Brasil.