Esquecida até agora, dimensão humana por trás do INSS ganha relevo

Os 21 milhões de benefícios pagos por mês pela Previdência Social ajudam a tirar da miséria grande parte da população idosa brasileira. Sem eles, haveria quase cinco vezes mais gente vivendo abaixo da linha da pobreza, entre pessoas com 65 anos ou mais. O dado, levado pela Central Única dos Trabalhadores (CUT) à quinta reunião do Fórum Nacional da Previdência Social, realizada na quinta-feira (10), colabora para humanizar um debate que, até agora, tem sido marcado por um enfoque contábil, o que tende a favorecer propostas de redução de direitos sociais.
“Somos contra uma reforma que só mexa nas despesas da Previdência. Há quatro reuniões que só se ouve o viés fiscalista, nós queremos uma reforma que seja inclusiva, que discuta também receitas”, disse o presidente da CUT, Artur Henrique da Silva Santos.
O diagnóstico de que o “viés fiscalista” predomina no Fórum não foi feito só pela central sindical um dia presidida pelo ministro da Previdência, Luiz Marinho, hoje na incômoda posição de mediador de negociação que opõe interesses que parecem inconciliáveis – o empresariado deseja uma reforma de viés ‘excludente’, que dificulte o acesso das pessoas ao INSS, porque assim economizaria impostos pagos para financiar o sistema.
Chamado a participar da reunião, Peter Spink, professor titular de Administração Pública na Fundação Getúlio Vargas de São Paulo (FGV-SP), condenou a preferência pela abordagem contábil. Um mal latino-americano que, segundo ele, ignora a importância da Previdência para gente de carne e osso.
“A nossa discussão tende a ser mais contábil, como em toda a América Latina. Falta a visão do que é dignidade, se esquece de discutir o direito das pessoas viverem em paz. Nunca haverá consenso enquanto o debate for técnico”, declarou o professor, inglês radicado no Brasil há mais de 20 anos.
Na opinião de Spink, para humanizar o debate da Previdência, é fundamental que o governo dê o máximo de transparência sobre o alcance do sistema, por exemplo. Os 21 milhões de pagamentos mensais beneficiam não só quem os recebem. De acordo com estimativas do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), outras 2,5 pessoas se favorecem indiretamente a cada pagamento. Ou seja, o INSS ajuda quase 75 milhões de brasileiros, 40% da população.
Um caminho com potencial para reforçar a transparência do INSS seria instituir uma gestão com trabalhadores, empresários e aposentados participantes. É uma recomendação da Organização Internacional do Trabalho (OIT) adotada no Uruguai com sucesso, segundo o representante dos trabalhadores na direção do INSS daquele país, Ariel Ferrari. “Deu transparência à gestão e conhecimento aos agentes”, disse Ariel, também convidado a participar da reunião do Fórum desta quinta-feira (10).
Ariel reforçou a defesa de uma abordagem da Previdência que leve em conta que, por trás da frieza contábil – déficit, gastos –, há pessoas que sobrevivem dos pagamentos. Daí que ampliar o acesso dos trabalhadores aos benefícios seria uma importante política social. “É a melhor forma de fazer distribuição eqüitativa da riqueza. Ampliar a cobertura é algo que precisa ser feito em toda a América Latina”, afirmou.
A inclusão de mais trabalhadores entre os que podem receber benefícios da Previdência ajudaria a classe, na avaliação da CUT, a enfrentar as posições patronais e governamentais na arena preferida deles, a contábil.

Fonte: Carta Maior (André Barrocal)