Por Luciane Udovic e Luiz Bassegio *
No mês de setembro, serão realizadas mobilizações no Brasil e no mundo. Serão vozes, gritos que querem ecoar contra o modelo neoliberal materialista que aliena e reduz homens e mulheres a meras mercadorias, engrenagens de produção e, principalmente, de consumo. Serão os gritos dos que não ficam indiferentes face aos problemas gerados pelos interesses egoístas de uma minoria prepotente e criminosa que detém o destino econômico global. Um império que nos submete às normas de um modelo selvagem, cujos valores são impostos de cima para baixo, de forma planejada e calculada, através de vários mecanismos, entre eles, uma mídia conivente, globalizada e mercantilizada.
Serão gritos contra um império que atende pelo nome de Estados Unidos e que pretende dominar o planeta econômica, política, cultural e militarmente.
Do ponto de vista econômico, este império procura apoderar-se das fontes de energia do nosso planeta, como o petróleo. Das riquezas naturais, como a água e a biodiversidade. Serve-se para isto de várias armadilhas, como é o caso da dívida externa, dos tratados de livre comércio e dos inúmeros planos que impõem pelas Américas. Um exemplo recente foi publicado no Jornal Britânico “Independent”. A matéria relata que o presidente George W. Bush está buscando fundos para implementar gasodutos que cruzariam as florestas tropicais da Amazônia peruana até a costa do Oceano Pacífico. De acordo com a publicação, o plano “enriqueceria algumas das empresas que mais contribuíram para a campanha de Bush, embora ponha em risco a floresta, ameace seus povos indígenas e ponha em risco espécies raras na costa”.
Para impor e manter sua política de dominação, o governo estadunidense se serve ainda da via militar. Mais de uma dezena de bases militares já foram implantadas por toda a América Latina e Caribe e outras estão em vias de implantação.
Do ponto de vista cultural, a indústria americana dita as regras no mundo inteiro, seja através de filmes, músicas, roupas, ou os inúmeros “fast foods” espalhados pelo mundo. É fundamental resistir a esta imposição para reforçar o caráter de identidade nacional. Por isso, como parte da agenda de mobilizações, está a semana de boicote aos produtos americanos. Simbolicamente, aos produtos do Mc Donalds, Coca-Cola, Esso e Texaco.
Na política, o império americano busca se concretizar através dos diversos tratados que, entre outras coisas, impedem aos governos da região de elaborarem políticas públicas que favoreçam os países. Um exemplo bastante em pauta é o Tratado de Livre Comércio das Américas – ALCA.
Os gritos também serão contra o pagamento da dívida externa e pela auditoria da dívida. Não aceitamos continuar pagando bilhões de dólares às custas de constantes cortes nos investimentos sociais.
No orçamento deste ano, estão previstos para a seguridade social, entendendo, entre outras coisas, segurança pública, assistência social, saúde, educação, cultura, habitação, saneamento, agricultura, transporte, ciência e tecnologia, 77,9 bilhões de reais. Praticamente a metade do que está previsto para o pagamento da dívida interna e externa, que é um total de 140,8 bilhões de reais. Se olharmos o quanto a dívida líquida do setor público avançou proporcionalmente ao PIB, damo-nos conta de algo assustador. Em 1994, a dívida correspondia a 30% do PIB; já em 2002, o montante saltou para 57,5%. Neste ano, o governo federal pagou, nos seis primeiros meses, 37 bilhões de reais para o pagamento da dívida interna; entretanto, ela passou de 687 bilhões para 709 bilhões de reais. Para o social, foram gastos 20 bilhões de reais.
Enfim, estão gritando os desempregados, os indígenas, os negros, os migrantes, as mulheres e os jovens. Estão gritando todos aqueles desprezados pelo sistema, os excluídos, os que sequer são necessários, os descartáveis.
As diversas mobilizações previstas têm como eixo fundamental a defesa da autonomia das nações, da independência de cada país, para que cada povo possa ser sujeito de sua história. O mundo irá gritar para que os Estados Unidos entendam que devem cuidar de seu país para que cada povo possa ser dono de seu destino. No Brasil, vamos nos somar aos gritos contra a exclusão social, em favor do Brasil e do povo brasileiro. O grito por independência e soberania.
O marco das mobilizações inicia-se com a Marcha das Margaridas no final de agosto e na semana da pátria, de 01 a 07 de setembro, por ocasião do 9º Grito dos Excluídos, que este ano terá como lema “Tirem as mãos… o Brasil é nosso chão”, reforçando, assim, a luta dos movimentos por uma nação livre, soberana, fundada na justiça social, na solidariedade e na igualdade de direitos. Serão intensificados os mutirões de coleta de assinaturas para a realização do plebiscito oficial sobre a implantação da ALCA. A simbologia utilizada será a Campanha de Vacinação contra o vírus da ALCA. Assinando o abaixo-assinado pelo plebiscito, as pessoas estarão se protegendo contra o vírus da ALCA. Daí a simbologia da caneta e da seringa.
Mas as mobilizações não param por aí. Na semana de 08 a 14 de setembro, será a vez do boicote aos produtos norte americanos, para chamar a atenção da população para que o Brasil não continue negociando a ALCA com um governo autoritário, que não respeita o Conselho de Segurança da ONU e faz pouco caso das leis internacionais. A guerra contra o Iraque provou o quanto é frágil a possibilidade de um acordo com o governo Bush. Todos são convocados a aderir ao boicote. Este é o momento para expressar ao governo Lula a nossa vontade de que o Brasil possa ter uma política soberana de desenvolvimento, com superávit comercial. Para garantir isto é que estamos mobilizados.
Concluindo mais esta etapa de luta, está previsto para o dia 16 de setembro, em Brasília/DF, a entrega do abaixo-assinado exigindo do governo a realização do plebiscito oficial sobre a ALCA.
Essas mobilizações vão além do Brasil, estendem-se a todos os continentes. No dia nove de setembro, serão realizadas manifestações mundiais contra a reunião da OMC, em Cancun, México; no dia 10, as manifestações serão em favor da soberania alimentar, promovidas pela Via Campesina, e, no dia 13, contra a Globalização e a Guerra. Finalmente, em 12 de outubro, acontecerá o quinto Grito dos Excluídos Continental, nas Américas e no Caribe.
* Luciane Udovic e Luiz Bassegio, da coordenação do Grito dos Excluídos Continental e da Campanha Continental contra a militarização.