Por Amauri Pinheiro*
Dia chegará em que um cérebro eletrônico lerá as iniciais e contestações, ouvirá partes e testemunhas, detectando a mentira por exame de fundo de olho; proferirá, no ato, a sentença líquida ao mero aceno do juiz; findo o prazo recursal de 5 horas, debitará direto na conta da reclamada ou de seus sócios ou alienará bens e, de pronto, marcará o pregão eletrônico. Tudo, na primeira instância, sem a ação de um único servidor. Apenas o magistrado sobreviverá.
A minuta da nova Resolução 63 do CSJT busca a reestruturação da Justiça do Trabalho, sonhando que este dia está próximo de chegar. Mas muito antes deste dia chegar, os poucos que sobrarem carregarão intensa carga de trabalho, porque hoje estão mordendo as iscas, tais quais os peixes abocanhando umas poucas funções comissionadas, comemorando as ditas vitórias, enquanto o anzol lhes atravessa a guelra, sufocando e arrastando, como um boi, direto para o matadouro.
Assim negociam os servidores do TRT com o Conselho Superior da Justiça do Trabalho. Das reivindicações apresentadas, o colendo irá aceitar alguns acréscimos no quantitativo de funções comissionadas para deleite dos agraciados.
Oculta, assim, o anzol no qual as iscas estão fixadas. Na verdade, este já circula nestes mares desde 2016, quando o CNJ apresentou a Resolução 219, agora ressuscitada pela proposta da nova Resolução 63 do CSJT, através do art. 8º: “A lotação de servidores em unidades judiciárias de primeiro e de segundo graus deverá ser calculada na forma do Anexo IV da Resolução CNJ nº219/2016”. Este anexo determina: “quando a soma da lotação paradigma das unidades judiciárias de um determinado grau de jurisdição se mostrar SIGNIFICATIVAMENTE INFERIOR à lotação existente, considerando, inclusive, os servidores decorrentes da aplicação do art. 3º, o tribunal poderá substituir na fórmula da LP a medida “Terceiro Quartil – Q3” pela de “Segundo Quartil – Q2” (ou mediana)”.
Astuta, a ANAMATRA propôs substituir o “significativamente inferior” por 10%. Mas o colendo não aceitou, talvez dizendo que não poderia contrariar o egrégio CNJ.
A recusa tornou evidente que a aplicação das fórmulas contidas no anexo IV da Res. CNJ 219/16 levará a uma redução muito … muito … muito (e não é pleonasmo) maior que 10% do quantitativo de servidores nas unidades. Estes deverão ser abraçados pelo art. 18 § 1º da nova Res 63 “a critério dos Tribunais, poderão ser criadas unidades para lotação de servidores excedentes”.
Não à toa o grupo de trabalho que originou esta proposta de “reestruturação da Justiça do Trabalho” dividiu as varas em duas: Gabinete de Juiz e Secretaria. Não à toa foi procurar na justiça estadual (TJSP, TJSE, TSMS e TJRO) experiências para propor a fusão de secretarias nas varas da JT. Claro, com o reduzido quantitativo de servidores a solução será fundir as secretarias. Não à toa o art. 14 § 2º da nova proposta estabelece: “as Escolas Judiciais serão responsáveis pela capacitação dos magistrados e servidores do Tribunal em todos os temas de formação”, recusando neste caso a experiência dos Tribunais Estaduais – TJs – onde a formação de servidores é desvinculada da de magistrados.
Mesmo assim, ao que tudo indica, a “caça” parece correr atrás das iscas. Soubessem os servidores a força que têm não seriam conduzidos tal qual uma boiada ao som dos berrantes rumo ao matadouro. Urge que se retirem os “tapa-olhos” e que se denunciem as fórmulas da Resolução CNJ 219/16, pois através delas tal reestruturação, nas condições tecnológicas atuais, conduz a inviabilização da Justiça do Trabalho e não pode haver País justo e democrático sem uma verdadeira justiça entre empregados e empregadores.
*Amauri Pinheiro é diretor do Sisejufe e servidor aposentado do TRT1