A Comissão de Constituição, Cidadania e Justiça da Câmara dos Deputados aprovou, pouco antes das 3 horas da madrugada desta quinta-feira,15, a admissibilidade da proposta de emenda constitucional referente à Previdência Social. O governo obteve 31 votos favoráveis ao parecer do relator Alceu Moreira (PMDB-RS), apresentado em menos de 24 horas, enquanto 20 deputados votaram contra a admissibilidade da PEC 287/2016. Partidos da base aliada de Michel Temer (PMDB) chegaram a substituir deputados, às pressas e numa operação que teve a sua legitimidade e legalidade questionada, para assegurar votos favoráveis ao governo.
A votação decorreu de um acordo que levou a oposição a suspender a obstrução que fazia na sessão. Em contrapartida, o governo foi obrigado a recuar em sua intenção de instalar ainda esse ano a comissão especial que analisará a matéria. O líder do governo na Câmara, deputado André Moura (PSC-SE), anunciou o compromisso de só criar e instalar a comissão especial em fevereiro, após a eleição da Mesa Diretora da Câmara.
Mesmo com o acordo, a sessão iniciada à tarde se estendeu por 12 horas. A votação a altas horas da madrugada recebeu muitas críticas, inclusive de deputados da base aliada do governo – entre eles Esperidião Amim (PP-SC) e Rogério Rosso (PSD-DF). Rosso é um dos candidatos à Presidência da Câmara.
A Comissão de Constituição e Justiça aprovou a admissibilidade da PEC da Previdência – isto é, admitiu a sua tramitação por considerar que ela não afronta a Constituição Federal. O mérito da questão será debatido na comissão especial, que terá pelo menos 40 sessões. Com o adiamento da instalação da comissão especial, fica muito difícil para o governo Temer cumprir o cronograma por ele anunciado para a PEC – no qual previa votá-la em Plenário em abril, para então seguir para o Senado.
EBC e PLP 257
Por volta das 21 horas, a sessão foi interrompida por duas horas por conta de votações que se realizariam no Plenário da Câmara. O presidente da casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ), pôs em votação a polêmica medida provisória referente à EBC (Empresa Brasileira de Comunicação). Depois, quando estava em pauta a nova versão do PLP 257/2016, que adota medidas de ajuste fiscal permanente nos estados, suspendeu as votações para que os trabalhos na CCJ fossem retomados.
Os partidos de oposição, que vinham obstruindo a sessão da CCJ, ratificaram o acordo por considerar que ganham com isso tempo para combater a proposta. O governo Michel Temer (PMDB) possuía, em tese, ampla maioria para aprovar a PEC 287/2016 na comissão, mas a manutenção da obstrução estenderia a sessão ainda mais e talvez ela não tivesse sido aprovada na madrugada. O “acordo” foi firmado pouco antes das 19 horas.
Lideranças de partidos de oposição ressaltaram não aceitar negociar nada com relação ao mérito e afirmaram que votariam contra a admissibilidade. O temor da oposição era que o governo, aprovando a admissibilidade, instalasse imediatamente a comissão especial e os prazos regimentais para a votação da proposta começassem a correr – o que seria ainda mais significativo no caso de convocação extraordinária do Congresso Nacional em janeiro.
Disputas
O risco de a falta de quórum derrubar a sessão talvez explique a posição favorável do governo ao acordo. Mas o que provavelmente esteve por trás dessa movimentação foi a intenção de, por um lado, cumprir o cronograma de votação pretendido pelo Planalto para a CCJ e, por outro, não tratar da polêmica proposta concomitantemente com os previstos embates com relação à eleição do próximo presidente da Câmara.
O governo também demonstrou insegurança com relação a sua própria base de apoio – que poderia rachar caso o acordo não fosse costurado, principalmente os setores que integram o chamado “Centrão”. Ao ponto de alguns deputados da base de Temer terem sido substituídos pelos respectivos partidos para “assegurar” o voto a favor da PEC. Teria sido o caso da deputada Jozi Araújo (AP), do PTN, substituída por Alexandre Baldy (GO), como titular do colegiado. A troca ocorreu após a meia-noite.
Requerimento
Pouco antes de o relator da proposta começar a ler o seu relatório – apresentado em menos de 24 horas após ser escolhido para relatar o assunto –, o PSOL solicitou a retirada da matéria de pauta, requerimento que acabou rejeitado. Anteriormente, a base governista já havia recusado a proposta de convocação de uma audiência pública para tratar do tema antes que se votasse a admissibilidade.
O deputado Ivan Valente (PSOL-SP) disse que a emenda constitucional, se aprovada, porá fim à possibilidade de acesso à aposentadoria para a maioria dos trabalhadores no Brasil. Sobre a conta da Previdência “não fechar”, argumento do governo para defender a proposta, mencionou os devedores do INSS que não são cobrados, as isenções fiscais, a sonegação e as despesas com juros das dívidas públicas. “Num país que paga 510 bilhões por ano para banqueiro e rentista, claro que a conta não fecha”, disse. O deputado Arnaldo Faria de Sá (PTB-SP) disse que são justamente os empresários sonegadores e devedores do INSS os que mais defendem a aprovação da reforma da Previdência. “São quase 500 bilhões de dívidas que não são cobradas”, afirmou.
Posicionaram-se contra a proposta, além do PSOL, a Rede, o PT, o PCdoB, o PDT e alguns parlamentares do PTB, do PP e do PSB.