Uma explosão de criatividade, irreverência e indignação tomou a Avenida Paulista neste 8 de Março, Dia das Mulheres. A cor lilás, símbolo da luta do feminismo, confundiu-se com as cores preta, de luto, e vermelha, de luta em um protesto de diversas idades e tribos antiimperialistas. No Brasil de todas as religiões e raças o grito da paz ecoou sob bombas de gás lacrimogêneo, mas a repressão da polícia paulista não apagou o brilho dos milhares de manifestantes que entoaram “Bush, nunca mais, sou mulher e estou na luta pela paz”.
Unidade promove maior manifestação do país A manifestação iniciou com uma concentração na Praça Osvaldo Cruz, centro da cidade de São Paulo, por volta das 15 horas de hoje (8). A fotografia das bandeiras presentes foi o retrato do primeiro protesto, depois da eleição de Lula, que possibilitou a unidade entre partidos de esquerda, organizações e entidades dos movimentos sociais. Tudo isso para dizer em alto e bom som o quanto Bush é uma persona non grata no Brasil. O resultado foi a maior das manifestações anti-Bush no país, com mais de 20 mil pessoas que seguiram da Praça pela Avenida Paulista, até o vão livre do Masp.
Na concentração ao final do ato, um fato inédito para um protesto com este grau de unidade na diversidade: apenas mulheres discursaram no carro de som. Diferente do que havia sido previamente acordado pela Coordenação dos Movimentos Sociais (CMS), que preparou a atividade, nem mesmo o ato político final contou com falas masculinas. As mulheres tomaram de assalto o microfone. Muitas delas, conhecidas apenas nas lutas cotidianas de suas organizações, ficaram conhecidas dos milhares de participantes da manifestação.
O protesto teve dezenas de alas distintas. As da União Nacional dos Estudantes (UNE), do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST) e da Marcha Mundial das Mulheres (MMM) se destacaram. Batucadas e hip hop acompanharam os incansáveis manifestantes destas alas, que levavam consigo pirulitos, bandeiras, faixas, nariz de palhaço e bonecos. Mas o colorido da primeira atividade que construiu a unidade dos movimentos sociais também foi tingido de algumas polêmicas, que se compuseram com o sentimento antiimperialista comum a todos.
As diferenças sobre um 8 de Março marcado pelo Fora Bush
Entre as entidades feministas que coordenaram a manifestação, muitas opiniões convergentes e divergentes sobre um 8 de Março marcado pela visita de Bush. Para algumas entidades, a visita ajudou a manifestação, para outras atrapalhou, e há ainda aquelas que disseram não fazer diferença nenhuma.
Para Cláudia Rosa, da Liga Brasileira de Lésbicas, “o imperialismo é o irmão mais velho do machismo, do preconceito e da opressão. Por isso, o 8 de Março-Fora Bush caiu muito bem ao Brasil”.
Já para Roseli Paini, do MST, a luta das mulheres e contra o imperialismo está intimamente ligada à luta contra o agronegócio. “Para nós a luta antiimperialista e por mais direitos para as mulheres passa pelo fim do agronegócio. Além disso, queremos marcar nesta manifestação nosso repúdio a todo e qualquer negócio entre o Brasil e os EUA, principalmente no que diz respeito ao etanol”, acentuou Roseli.
“Para nós esse 8 de Março não teve muita diferença dos demais. Afinal todo dia 8 de Março as mulheres vão às ruas na luta por seus direitos e contra o imperialismo. Talvez, a única diferença deste dia 8 para os outros é que há uma maior presença de homens na manifestação”, declarou ao Vermelho Mirim Nobre, da Marcha Mundial das Mulheres.
Para a União Brasileira de Mulheres (UBM), o 8 de Março ganhou muito com a manifestação Fora Bush. Segundo Liege Rocha, liderança da UBM, esse deve ter sido o maior 8 de Março já realizado no Brasil, a manifestação anti Bush foi muito importante para que isso ocorresse. “Conquistamos a Lei Maria da Penha, mas ela é apenas um começo. O 8 de Março que adquiriu a dimensão que vemos aqui ajudará para que outras reivindicações importantes se tornem mais públicas e com isso mais possíveis de se tornarem realidade”, destacou Liege.
A mais jovem mulher a falar na trajetória da manifestação, Louise Silva, vice-presidente da UNE, disse que “o ato anti Bush no dia 8 de Março foi muito importante para o sucesso desta manifestação e fez toda diferença. Primeiro porque muitas mulheres que não participavam do ato pelo fato de ele ser o Dia das Mulheres, passaram a participar porque ele foi também um ato contra Bush. Segundo, porque lutamos contra a violência e Bush é o maior exemplo do uso covarde da agressão do maior sobre o menor, tal qual como um homem quando agride uma mulher.”
Vale notar a ala da Coordenação Nacional de Lutas (Conlutas) que, diferente da postura que vinha assumindo do início do governo Lula até aqui, não adotou a bandeira pelo Fora Lula, mas sim pelo Fora Lula do Haiti. Aparentemente o Conlutas deixou de contestar a relevância do mandato de Lula para o Brasil.
Repressão tentou, mas não intimidou manifestantes
Por volta das 17 horas, quando a manifestação se instalava no vão livre do Masp para a realização do ato político que encerraria a atividade, iniciou-se o primeiro de muitos conflitos que aconteceram entre manifestantes e a polícia militar de São Paulo durante o protesto.
Dezenas de bombas de gás lacrimogêneo e gás de pimenta foram jogadas no meio da multidão, além de balas de borracha que indiscriminadamente foram atiradas por policiais que, na sua maioria, não contavam com identificação.
Segundo o coronel Ailton Brandão Araújo, comandante da operação, “a polícia militar agiu em função da ação de pessoas infiltradas na manifestação que estavam tumultuando o protesto desde o seu início”. O coronel Brandão declarou ainda que “a manifestação seguia de forma pacífica, mas ao tentarem tomar a pista da Avenida Paulista – direção Paraíso – liberada especialmente para o tráfego de ambulâncias, a polícia teve que agir para manter a ordem”. Mais de 300 homens de todos os batalhões do centro atuaram na operação e a tropa de choque foi acionada.
Até o momento foi apurado que os conflitos deixaram pelo menos oito feridos e quatro presos. Entre os feridos, jornalistas, transeuntes, manifestantes e policiais. O presidente da UNE, Gustavo Petta, teve ferimentos de estilhaços de bombas de gás lacrimogêneo na perna e cotovelo, além de hematomas na barriga e nas costas.
“Eu estava justamente tentando evitar o confronto quando fui atingido. Se a polícia militar já havia identificado pessoas infiltradas na manifestação porque agiu da forma que agiu, agredindo a multidão e colocando em risco a vida de mulheres e crianças”. Para ele o episódio “demonstra o profundo despreparo da polícia de São Paulo, gerenciada pelo governo Serra, diante deste tipo de situação”.
Mais protestos seguirão acontecendo dia 9
Gustavo adiantou que “a ação da polícia militar não intimidará a juventude a seguir manifestando seu repúdio a visita de Bush e amanhã (9) serão realizados mais protestos”. Eles prometem instalar o Comando de Caça ao Bush que quer perseguir o visitante norte-americano com protestos por onde ele passar.
Segundo Thiago Franco, da União Brasileira dos Estudantes Secundaristas, (Ubes), cerca de mil jovens deverão se concentrar a partir das 9 horas no Monumento das Bandeiras, em frente ao Parque Ibirapuera. “A atividade de sexta (9) dará continuidade a esta grande manifestação, já que a caravana da juventude perseguirá Bush por toda a cidade”.
A União da Juventude Socialista (UJS) integrará a atividade que inicia pela manhã e deve se estender até a saída de Bush do Brasil. “Vamos pegar no pé do maior genocida do mundo, ele não pode sair daqui sem ter certeza de que é uma persona non grata para nós e todo o povo latino americano”, declarou Marcelo Gavião, presidente da UJS.
Fonte: Vermelho (Carla Santos)